Por Fabio Graner e Fábio Pupo – Valor Econômico

Mesmo com um desempenho fiscal superior ao esperado em 2017, o governo revisou para pior suas projeções sobre o buraco que terá para cobrir na chamada “regra de ouro” das contas públicas em 2018. Esse é o dispositivo previsto na Constituição que define que o Tesouro não pode emitir dívida para pagar gastos correntes (como pessoal e Previdência).

Pelas novas contas, o rombo previsto para 2018 subiu mais de R$ 20 bilhões, atingindo R$ 208,6 bilhões. Mesmo assim, a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, disse acreditar que essa regra fiscal será cumprida, graças a um conjunto de quatro medidas anunciadas ontem para fazer frente a esse problema. Ela anunciou ainda que em 2017 houve cumprimento da “regra de ouro”, com uma margem positiva de R$ 28,8 bilhões, o que só foi possível graças à devolução antecipada de R$ 50 bilhões do BNDES ao Tesouro.

Com forte contração de despesas, que tiveram queda real de 1%, o governo central (Tesouro, Previdência e BC) terminou o ano passado com resultado primário bem melhor que meta de déficit de R$ 159 bilhões. O saldo negativo final em 2017 foi de R$ 124,4 bilhões.

O esforço do lado do gasto foi tão forte que fez despencar os investimentos ao menor nível em mais de uma década. O governo investiu R$ 45,7 bilhões, o equivalente a 0,69% do PIB, ante 1,04% em 2016, nível considerado “muito baixo” até mesmo por Ana Paula.

Outra métrica importante para se ter a dimensão do tamanho ajuste nos gastos é que as despesas totais ficaram cerca de R$ 30 bilhões abaixo do programado, caindo de 20% para 19,5% PIB. Ana Paula ressaltou que, isoladamente, o Tesouro registrou superávit em 2017 após dois anos negativos, “compensando em parte o déficit acentuado na Previdência”.

Com os resultados bastante discrepantes em relação às metas e limites previstos, a secretária do Tesouro lembrou que o déficit ainda é bastante elevado e que a trajetória da dívida é de alta, precisando ser estabilizada. “Estamos falando de um déficit muito acentuado, de R$ 124 bilhões. É algo que precisamos reverter. Não há o que comemorar”, afirmou. O rombo do ano foi o segundo pior da história.

Segundo ela, o governo precisaria registrar um superávit para estabilizar a dívida e levar a um cenário mais “sólido” para as contas públicas. Ela disse que o governo está comprometido com a transparência nas discussões sobre a meta fiscal e engajado em cumprir os limites legais sem “ajuste contábil”.

Segundo Ana Paula, o fato de o governo ter pedido ao Congresso autorização para um rombo maior no meio do ano passado refletiu o fato de, até meados do ano, ter havido frustrações de receita e elevados riscos relativos a leilões de infraestrutura – situação que, diz, foi revertida após agosto e ensejou resultado melhor que a meta anterior, de déficit de R$ 139 bilhões.

O lado das receitas de fato também teve contribuição para o saldo fiscal mais favorável, ainda que em dimensão menor que as despesas. A arrecadação foi mais forte sobretudo em dezembro, quando houve expansão de 31%, já descontando-se as transferências a governos regionais. No ano todo, a receita teve alta real de 2,5%, embora deva-se lembrar que ficou R$ 32,9 bilhões abaixo do previsto no Orçamento do ano.

Segundo ela, o fato de o rombo fiscal ter ficado cerca de R$ 35 bilhões menor que a meta decorre também da dificuldade de prever os números. “Quando encerramos o ano, é óbvio que alguma margem você tem para cumprir a meta. É muito difícil cravar a meta.”

Em relação à piora na projeção de insuficiência da “regra de ouro” em 2018, Ana Paula explicou que isso ocorreu principalmente por efeitos de uma atualização inflacionária. “Como o IGP-M cresceu menos que a estimativa anterior, reduziu o valor da amortização, que é uma despesa. Então a insuficiência aumenta. Dentre os fatores, esse foi o mais relevante”, afirmou, explicando que esse impacto foi de R$ 35 bilhões.

Em relação às medidas para o cumprimento da regra em 2018, Ana Paula informou que, além dos R$ 130 bilhões que o BNDES deve devolver, o governo vai fazer uma ampla revisão dos restos a pagar não processados – despesas autorizadas, mas não executadas. Se o estoque fosse todo eliminado, haveria ganho de R$ 48,3 bilhões.

Há ainda outras duas medidas. Uma é a extinção do FSB) e do FND, com projeto permitindo liberação contábil de recursos que entraram no caixa em anos anteriores. No FSB, isso pode gerar R$ 26 bilhões e no FND, R$ 16 bilhões.

A quarta medida é a desvinculação de recursos de superávits passados, que estão no caixa, mas com destinação específica. Ana Paula, contudo, não estimou o impacto da medida, que depende de aval do Tribunal de Contas da União (TCU). Questionada se em 2018 não estaria se desenhando um cenário de expansão fiscal em plena eleição, a secretária tergiversou e apenas disse que receitas extraordinárias ou acima do previsto não vão liberar novas despesas, que se limitarão ao teto.