Por Valor Econômico

15/03/2018 – 05:00

Um dos temas que mais preocupam urbanistas quando se fala em futuro das cidades diz respeito à gestão inteligente dos recursos hídricos. “Uma cidade como São Paulo, que é a mais desenvolvida do país, ainda joga boa parte de seu esgoto não tratado nos seus rios. Qual qualidade de vida se pode ter dessa forma? Limpar os rios é uma das causas mais urgentes da cidade”, diz Marisa Moreira Salles, fundadora da plataforma Arq.Futuro.

O que ocorre em São Paulo nada mais é que um retrato de todo o país. Segundo o “Atlas Esgotos – Despoluição de Bacias Hidrográficas”, divulgado pela Agência Nacional de Águas (ANA) no fim do ano passado, 81% dos municípios brasileiros despejavam pelo menos metade do esgoto que produzem diretamente nos cursos de água, sem tratamento algum.

Continuar poluindo os rios em um grande centro urbano que há poucos anos passou por uma grave crise de abastecimento de água, ainda não completamente solucionada, parece distanciar ainda mais o município de um ideal de cidade inteligente e do cumprimento dos objetivos da Agenda 2030 da ONU, que contempla o desenvolvimento sustentável. Essa é a visão do ambientalista e educador Luiz Campos, da iniciativa Rios e Ruas, que realiza atividades de reconhecimento e identificação dos rios da cidade.

“Quando avaliamos as medidas que estão sendo tomadas no sentido de prever e evitar novas crises de abastecimento de água, percebemos que estamos longe de soluções inteligentes. A mentalidade continua sendo a de fazer transposições, construir novas represas. Ou seja, buscar mais água e cada vez mais longe”, diz Campos. Ele acrescenta que são pouquíssimas as ações para recuperar os sistemas existentes na própria cidade, como o Cantareira. “Não vemos ações, por exemplo, para recuperar as nascentes dos afluentes que abastecem o Cantareira.” Essas, diz, seriam medidas mais razoáveis e menos onerosas para o Estado.

Para a urbanista, arquiteta Maru Whately, idealizadora da Aliança pela Água, movimento que reúne mais de 60 entidades, é urgente que São Paulo adote medidas de segurança hídrica. A organização conseguiu em dezembro de 2017 a aprovação em primeira votação de um projeto de lei que cria a Política Municipal de Segurança Hídrica e Gestão das Águas em São Paulo.

O objetivo, segundo Whately é aumentar o protagonismo do município para gestão de suas águas e adotar mecanismos para gestão de recursos hídricos, proteção ambiental, saneamento e saúde, além de gerar e monitorar informações sobre o assunto, conferindo maior transparência e controle social. “São Paulo precisa seguir o exemplo de Ribeirão Preto, que é a primeira cidade a aprovar uma lei de segurança hídrica”, diz Whately.

Uma pesquisa do World Resources Institute (WRI) aponta que mais de 30 países poderão enfrentar crises hídricas de alto risco nas próximas duas décadas. O que aconteceu em São Paulo até 2015 e o que está ocorrendo na Cidade do Cabo, na África do Sul, neste ano, dá uma dimensão da gravidade dessas crises. “Cuidar da água é uma questão urgente e universal.

E que tem reflexos em muitas outras áreas, como saúde, alimentação, educação”, diz Whately.