Por Fernanda Pires – Valor Econômico

16/07/2018 – 05:00

Concluída a primeira metade do ano, fica cada vez mais claro que o cronograma dos leilões de transporte elaborado pelo governo federal caminha a passos mais lentos do que Brasília – e os investidores – gostaria.

Em rodovias, cuja recente greve dos caminhoneiros expôs a dependência do país em relação ao modal, não houve um projeto concluído pelo Programa de Parcerias de Investimento (PPI). Mas há nove classificados como “em andamento” no site do PPI, sendo que apenas um teve o edital lançado. As regras para a licitação da Rodovia de Integração do Sul (BR101/290/386/448/RS) saíram no início deste mês e a licitação está prevista para ocorrer no quarto trimestre. O lote de 473,4 quilômetros será concedido por 30 anos e prevê investimento de quase R$ 8 bilhões.

Nas ferrovias, que compõem a espinha dorsal estruturante entre a origem da carga e os portos, edital algum foi para a rua.

E nenhum dos cinco pedidos de prorrogação antecipada mediante novos investimentos foi assinado.

Portos foi a área de transportes que mais avançou no PPI. Onze projetos foram concluídos, sendo três arrendamentos de áreas e oito prorrogações de contratos, mas há que se ponderar que foram projetos de menor envergadura e com exigência de menos investimento do que os das demais áreas.

Dos 16 projetos em andamento no segmento portuário, 13 arrendamentos serão licitados, sendo que seis tiveram editais publicados e um deles já concluiu o certame, só faltando a assinatura do contrato. Mas, sempre conforme o cronograma que está no site do PPI, três desses leilões estavam previstos para ocorrer no segundo trimestre – que já acabou e sem a realização das licitações.

Especialistas avaliam haver uma conjunção de fatores que resultam nesse cenário de lentidão. O primeiro é o que classificam como “falta de musculatura no PPI”, que não teria um corpo suficiente de técnicos para destravar uma lista de concessões, privatizações e Parcerias Público-Privadas (PPPs) que só faz crescer. Enquanto isso, “do outro lado”, os órgãos de controle avançam em suas atribuições e estão cada vez mais qualificados. Existe uma assimetria. Hoje, dificilmente um gestor público assina algo sem o aval do TCU e isso estende os prazos.

Para Claudio Frischtak, sócio da consultoria Inter. B, a única instituição existente no âmbito federal com número de pessoas que poderia efetivamente definir o modelo das concessões, adaptá-lo, e convencer de forma razoavelmente rápida os órgãos de controle é o BNDES. “Quem tem o ‘mandato’ não tem musculatura e quem não tem o ‘mandato’ tem musculatura. O BNDES tem excesso de capacidade”, afirma.

Outros dois aspectos que pesam é o grau de insegurança jurídica muito alto e a imprevisibilidade regulatória do país. “Isso piorou pela percepção que os investidores têm de que as agências reguladoras estão politizadas há muitos anos e não houve melhora palpável. No que se traduz? Em problema de risco regulatório, menos projetos e falta de planejamento”, diz Frischtak.

O ajuste fiscal minou a capacidade do poder público investir e do lado privado sobra insegurança. O resultado desse cenário é óbvio. Os investimentos em infraestrutura recuaram nos últimos anos e devem ficar em 1,5% do PIB em 2018, conforme a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). A fatia é considerada ínfima.

Levando em conta áreas como energia elétrica, transportes, saneamento básico e telecomunicações, o setor de infraestrutura recebeu R$ 127,7 bilhões em investimentos público e privado em 2015, R$ 109,9 bilhões em 2016 e R$ 106,4 bilhões em 2017. Em relação ao PIB, a redução foi de 2,4% do PIB em 2014 para 1,6% do PIB em 2017. Para 2018, a estimativa é de R$ 105 bilhões, quase 1,5% do PIB.

Não há dúvida de que medidas como o PPI são importantes e devem ser mantidas pelos próximos governos para auxiliar a destravar investimentos em infraestrutura. Mas é necessário trabalhar para que se diminua o lapso entre a concepção de projetos bem estruturados e a realização dos leilões.