Por Sergio Lamucci e Alex Ribeiro, Valor Econômico

A recuperação da economia brasileira é lenta e frágil, mas o risco de uma recessão hoje é muito baixo, diz a economista Marcelle Chauvet, da Universidade da Califórnia, em Riverside. Segundo ela, a fragilidade da retomada se deve a uma série de incertezas, como a relacionada às eleições de outubro.

“Os fatores de incerteza, que são vários, não causam uma recessão; eles atuam como se fosse um freio na produção e no consumo, por exemplo”, diz Marcelle, integrante do Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace) da Fundação Getulio Vargas (FGV), responsável por definir a cronologia de expansões e recessões do país.

Para 2019, ela vê um cenário em aberto para a economia brasileira, não sendo possível descartar uma recessão nem um crescimento mais forte da atividade, a depender do resultado das eleições e das políticas que venham a ser adotadas pelo próximo presidente.

“Tudo pode ocorrer”, afirma Marcelle, que ressalta também a importância para o Brasil do que se passa na economia americana. A continuidade de um crescimento forte nos EUA pressiona os juros americanos, o que atrai capital estrangeiro para o país, diz a economista.

O modelo de Marcelle para a economia brasileira mostra que hoje a probabilidade de uma recessão é baixíssima – de apenas 3%. De acordo com ela, o modelo “extrai o ciclo comum da economia inteira”, levando em conta diversas variáveis. “Ele separa o sinal do ruído”, diz Marcelle. Se a indústria subiu e a agricultura caiu, o modelo extrai o movimento de cada um desses segmentos relacionado ao ciclo de toda a economia, e não de movimentos específicos setoriais.

A partir daí, cria-se um indicador coincidente, que hoje aponta uma chance muito pequena de recessão, segundo Marcelle, que participou na semana passada da 34ª Conferência do Ciret (Centre for International Research on Economic Tendency Surveys), promovida pela Fundação Getulio Vargas, no Rio.

No fim do ano passado, Marcelle via como possível um crescimento de 2,5% a 4% para o PIB de 2018, com base no intervalo de confiança de seu modelo de previsão. Naquele momento, não havia um cenário de tanta incerteza e o país não havia sofrido o choque da greve dos caminhoneiros, que afetou em cheio a economia brasileira por 11 dias, começando em 21 de maio. Hoje, o consenso dos analistas ouvidos pelo Banco Central (BC) é de uma expansão de 1,36% neste ano.

O principal efeito negativo da paralisação dos motoristas foi sobre a confiança, diz a professora da Universidade da Califórnia. Foi mais um fator a pesar sobre a economia, num cenário marcado por incertezas. Segundo ela, o episódio mostrou a “fragilidade da estrutura produtiva e econômica” do país, uma vez que uma greve de caminhoneiros parou a produção e o abastecimento. Além disso, também ficou evidente a vulnerabilidade do governo.

Ao falar dos motivos que têm causado incerteza, Marcelle cita o fato de o país ter passado por uma recessão “tão duradoura e tão profunda” – de acordo com o Codace, o período recessivo começou no segundo trimestre de 2014 e só se encerrou no quarto trimestre de 2016. Nesse ambiente, as expectativas de empresários e consumidores ficam “impregnadas pelo pessimismo dos últimos anos”, diz Marcelle. Isso afeta decisões de consumo e de investimento.

Ela também menciona as notícias frequentes sobre corrupção. “Elas causam desconforto e desconfiança, provocando uma incerteza muito grande.” Outro fator de indefinição está relacionado às eleições presidenciais deste ano. “A incerteza política é muito grande porque ninguém sabe o que vai ocorrer”, afirma a economista, lembrando que há candidatos com posições extremas “de um lado e de outro”, havendo o risco de que o próximo presidente adote políticas muito negativas para a economia. Esse conjunto de incertezas torna a recuperação frágil.

Marcelle também chama a atenção para a importância do cenário internacional, ressaltando a situação da economia americana. Com crescimento forte, o Fed tem elevado os juros, atraindo capital externo para os EUA, um movimento desfavorável para países emergentes como o Brasil.

A economista diz não ter hoje uma estimativa para o crescimento da economia em 2018 e em 2019. “Eu precisaria rodar novamente o modelo.” Para o ano que vem, ela vê um quadro muito aberto. É possível um cenário bastante positivo se o novo presidente tiver capacidade de negociação no Congresso, aprovando uma reforma da Previdência e enfrentando a questão dos gastos do governo, por exemplo. Se adotar políticas equivocadas, porém, nem uma recessão pode ser desconsiderada.

A professora da Universidade da Califórnia destaca a necessidade de medidas para combater o desequilíbrio das contas públicas, mas diz que um ajuste fiscal abrupto teria um impacto negativo sobre a atividade, numa economia que já se recupera lentamente. Para ela, é fundamental uma reforma da Previdência e iniciativas que apontem para um ajuste de médio prazo das contas públicas. Na visão de Marcelle, um ponto importante seria rever créditos e subsídios concedidos pelo governo. Há muitas desonerações que podem ser revertidas, contribuindo para melhorar o resultado fiscal.

A integrante do Codace diz que não foi surpreendida pela lentidão da atual retomada, mas sim pelo tamanho da recessão. Ela foi muito longa e muito profunda, reitera Marcelle. Nos 11 trimestres em que durou a recessão, houve uma perda acumulada do PIB de 8,6%, de acordo com números do Codace.