Por Raphael Di Cunto – Valor Econômico

26/04/2018 – 05:00

Num movimento para angariar o apoio das bancadas do Nordeste e Minas Gerais à privatização da Eletrobras e diminuir as resistências no Congresso, o relator do projeto da desestatização na Câmara, deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), afirmou ontem ao Valor, que vai propor elevar de R$ 9 bilhões em 30 anos para R$ 30 bilhões o repasse para as obras de revitalização do rio São Francisco.

O governo tinha sinalizado que topava incluir no projeto a transferência de até R$ 15 bilhões (R$ 500 milhões por ano), mas Aleluia achou insuficiente. “A fundação Renova, que faz a recuperação do vale do Rio Doce, gastará mais de R$ 20 bilhões. Porque o São Francisco terá só R$ 15 bilhões?”, questionou. O termo de ajustamento de conduta (TAC) da mineradora Samarco prevê repasse de R$ 24 bilhões em 15 anos pelos danos causados pelo rompimento de uma barragem em Mariana (MG). Ele diz que já avisou o governo, que não teria gostado da notícia.

Para o relator, o valor está aberto a negociação. Num primeiro momento, ele sinalizou que poderia reduzir a R$ 750 milhões por ano. Mas depois de o governo apoiar ontem a inclusão de diversos “jabutis” na medida provisória (MP) que preparará o terreno para a privatização, elevou o tom e disse que R$ 1 bilhão é um valor razoável. “Só o que o governo colocou em jabutis, como descotização da usina de Tucuruí, é mais do que isso”, disse.

Na opinião de Aleluia, se o governo está preocupado em não abrir mão de receita para fechar as contas este ano – a previsão no Orçamento é o Tesouro ficar com pelo menos R$ 12 bilhões da operação de “descotização”-, acabará sem dinheiro algum se não ceder. “O governo quer dinheiro, mas vai terminar não tendo nada”, disse. Ele ressaltou, contudo, que o Executivo tem margem para receber os R$ 12 bilhões este ano e ainda garantir os R$ 30 bilhões para o São Francisco, já que o valor para o rio será diluído ao longo de 30 anos. Uma fundação privada, que a ser criada junto com a privatização, vai gerir a aplicação do dinheiro.

Além disso, o relatório vai prever que parte da produção hidrelétrica do rio custeie o sistema de bombeamento d’água do São Francisco, que custará cerca de R$ 500 milhões por ano – e que o governo pretendia pagar com a venda de água do rio, o que Aleluia considera insuficiente.

Para evitar que a conta fique com o Tesouro Nacional no futuro, ele vai propor que uma cota anual da produção em megawatt seja repassada para manutenção das bombas. O valor, ainda não definido, aumentaria gradualmente a medida em que as obras da transposição forem avançando e mais bombas sejam necessárias.

A oposição diz que ao tentar conquistar votos com o aumento nos recursos para o São Francisco, o relator elevará o custo da energia para todos. “Quem votar a favor dessa privatização estará votando a favor do aumento da conta de luz”, disse o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).

Oposição e governo não chegaram a acordo sobre a data de apresentação do relatório. Aleluia queria ler o parecer dia 2 de maio na comissão, para abrir o prazo de emendas e discussão, e votar na primeira quinzena, calendário alinhado ao do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Já a oposição defendeu que é preciso aguardar pelo menos o fim das audiências públicas marcadas – ocorrerão seminários nos Estados entre 7 e 11 de maio. Com o impasse, o governo estudava levar o projeto direto ao plenário com um requerimento de urgência, mas ainda não tinha batido o martelo até a noite.