Por Rodrigo Polito, Camila Maia e Rafael Bitencourt – Valor Econômico

O governo está trabalhando nos últimos ajustes do texto da reforma do setor elétrico, que pretende encaminhar ao Congresso em até duas semanas. O Valor apurou que o Ministério de Minas e Energia (MME) prevê concluir e encaminhar o conteúdo à Casa Civil no fim desta semana. O texto pode ser apresentado em um projeto de lei (PL) proposto pelo Executivo, ou na forma de um substitutivo de um PL, de autoria do deputado Fabio Garcia (sem partido-MT), que já está tramitando na Câmara.

Neste momento, os técnicos do ministério trabalham no “ajuste fino” da proposta de mudança que vem sendo debatida desde o ano passado, quando o governo abriu a consulta pública para discutir o assunto. A iniciativa é considerada pelo ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, tão importante quanto a decisão de privatizar a Eletrobras. As duas medidas, que dependem da aprovação do Congresso, são encaradas como indispensáveis para o mercado acompanhar a evolução do setor.

“Não se trata de questão ideológica, mas de reconhecimento de que o modelo atual se esgotou, por ser fortemente baseado em pedidos de socorro ao governo, financiamento estatal e repasses de custos ao consumidor”, disse uma fonte do ministério

O Valor apurou que o governo deve manter as linhas gerais da nota técnica preparada pelo ministério em julho de 2017, acatando parte das contribuições feitas pelo mercado no ano passado. O texto deverá conter uma proposta de solução para o risco hidrológico (medido pelo GSF, na sigla em inglês), uma antecipação da abertura parcial do mercado livre de energia e aperfeiçoamentos na liquidação do mercado à vista, além pontos como a aplicação de tarifas horárias e melhoria do sinal locacional e de preço de cada fonte de energia.

O plano do governo era encaminhar o texto da reforma ao Congresso após a apresentação do projeto de lei de privatização da Eletrobras, o que ocorreu na semana passada, e também depois da publicação da MP que trataria da repactuação do risco hidrológico. A MP 814 saiu no fim do ano passado, porém sem incluir uma proposta de acordo para acabar com a judicialização em torno do GSF.

Se, por um lado, a ausência da repactuação do risco hidrológico na MP preocupou o setor elétrico, devido ao valor em aberto de R$ 6 bilhões no mercado de curto prazo da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), por outro lado o PL da reforma terá a oportunidade de equacionar esse problema, evitando novas perdas a partir deste ano.

“Nossa expectativa é que o PL inclua a solução para o GSF. Nos frustramos um pouco com a retirada da solução do GSF da MP 814”, afirmou o diretor de uma grande empresa privada de energia, em condição de anonimato. “É importante resolver o incêndio para fazer a reforma”, disse o executivo de outra empresa do setor, com relação ao impasse do GSF dos últimos anos.

“Temos uma expectativa grande de equacionamento de algumas questões pendentes que estão travando o setor elétrico. Um desses pontos é a questão do GSF, que deu origem a um travamento no mercado que chegou a um ponto em que se tornou insustentável. A cada mês, são bilhões e bilhões que deixam de ser liquidados na CCEE por força dessa indefinição”, disse o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales.

Com relação à abertura do mercado livre, a equipe de energia do governo vem trabalhando em uma antecipação do prazo para a abertura gradual do mercado, no âmbito da reforma. A nota técnica previa a redução gradual do limite mínimo de carga para migração para o mercado livre, por patamares, dos atuais 3 megawatts (MW) para 75 quilowatts (kW) em 2028.

A ideia é antecipar esse prazo para 2026. Também era prevista inicialmente a abertura até o patamar de 2 MW, em 2020. Esse limite deve recuar para 1 MW, no mesmo ano.

Já o mercado à vista de energia deve sofrer mudanças com a redução dos prazos das operações de compra e venda e a realização de liquidações com maior frequência. O governo avalia que também pode ser encurtado o prazo entre o pagamento e o consumo da energia negociada.

O governo também estuda incluir no texto da reforma um item que determina que a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) desenvolva estudos sobre os efeitos de uma eventual abertura total do mercado, incluindo consumidores residenciais.

Segundo projeções da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia Elétrica (Abraceel), a abertura parcial do mercado livre até 2028 permitiria a migração de cerca de 24 mil empresas, com potencial de redução de custos de R$ 2 bilhões por ano, em relação à tarifa do mercado regulado, uma economia média de 15%.

“Muito mais importante do que a privatização da Eletrobras é a mudança do modelo comercial de energia elétrica”, disse o presidente da Abraceel, Reginaldo Medeiros. “A reforma do setor tem menos polêmica que a privatização da Eletrobras e traz mais benefícios”, a