Por Lucas Hirata e Lucinda Pinto – Valor Econômico

Os investidores no mercado de juros futuros devem calibrar suas apostas para a política monetária à luz das novas projeções do Banco Central para inflação. Nesta quinta-feira, a autoridade monetária estende o horizonte de suas estimativas no Relatório Trimestral de Inflação (RTI), algo que pode sinalizar o espaço que a taxa Selic ainda tem para cair.

No horizonte de tempo até o fim de 2018, o modelo do BC tem apontado para inflação abaixo da meta, de 4,5%, considerando os cenários do mercado para a Selic. Com isso, a leitura entre os agentes financeiros é que a taxa de juros pode se aproximar ou até caminhar para menos de 7% no fim do ciclo.

Com o passar do tempo, entretanto, ganha mais relevância o cenário de inflação de 2019, quando o alvo do BC passa a ser mais baixo, de 4,25%. Isso porque o efeito máximo da política monetária se dá em dois anos, de acordo com estudos da própria instituição. Logo, os números nesse prazo podem até ter peso maior que de outras projeções no fim do ano. Desta vez, o RTI deve trazer projeções para o índice até o ano de 2020, como já informou o diretor de política econômica da autarquia, Carlos Viana, a economistas.

O economista-chefe da Icatu Vanguarda, Rodrigo Melo, afirma que a inflação pode até surpreender o BC para baixo, como já tem ocorrido. Dito isso, se as projeções do BC convergirem para a meta entre 2018 e 2019 com cenário de Selic a 7%, a taxa tem espaço para, no mínimo, recuar até esse patamar no fim do ciclo. “O risco é de inflação para baixo em relação às estimativas do BC”, acrescenta Melo.

Em termos de mensagem, a percepção no mercado é que não haverá grande alteração em relação ao sinal deixado nas comunicações recentes da instituição: o ritmo de cortes da Selic deve desacelerar gradualmente até o fim do ciclo.

Um aperto monetário já em 2018 não é um cenário de consenso no mercado. Até por isso, nos últimos dias, vem sendo reduzido o prêmio embutido no horizonte do atual ciclo de corte de juros. A diferença entre os contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) de janeiro de 2019 e janeiro de 2018, por exemplo, adentrou o terreno negativo e caiu ontem ao menor nível em mais de um mês. Considerada um termômetro de risco de curto prazo, a marcação era de -0,115 ponto percentual no término da sessão regular de ontem.

Ainda assim, o argumento de quem defende uma elevação de juros poderia se intensificar no caso de uma estimativa inflacionária bem acima da meta em 2019. “Se tiver um descolamento, talvez para 4,6% ou 4,7% na projeção de inflação de 2019, pode abrir espaço para apostas de aumento de juros no ano que vem”, diz o economista Silvio Campos Neto, da Tendências. Mas o mais provável é que a projeção fique em torno de 4,3% e 4,4%, “sem grande discrepância”, acrescenta.

A sustentação da Selic em níveis baixos por mais tempo deve depender ainda da evolução da reforma da Previdência. Por ora, o mercado não considera que isso acontecerá antes de 2019. O cenário da Mauá Capital contempla que a Selic voltará a subir em 2018, mesmo num cenário de reforma “mínima”. O economista-chefe da gestora, Alexandre de Ázara, trabalha com uma elevação de um ponto percentual a partir do nível do juro no fim do ciclo de alívio monetário. Sendo assim, em seu cenário base, a taxa cai para 6,75% antes de subir para 7,75%.

Outro ponto de atenção é como o BC deve definir o ambiente externo. Por ora, a recuperação da atividade global e a postura ainda acomodatícia dos principais bancos centrais tem se mostrado algo benigno aos emergentes. A leitura, entretanto, pode ser colocada à prova com a decisão do Fed amanhã. É baixa a expectativa de alta de juros já neste encontro, mas o Fed pode trazer sinais sobre seus próximos passos, inclusive a redução do balanço patrimonial. Foi justamente diante dessa expectativa que o dólar ganhou terreno globalmente ontem e, por aqui, avançou 0,66%, a R$ 3,1343. Na B3, o contrato DI para janeiro de 2021 recuou de 8,970% para 8,950%.