MP publicada para destravar venda da estatal recebeu adendos que oneram consumidor e União

Taís Hirata – Folha de São Paulo

26.abr.2018 às 2h00

A privatização da Eletrobras ainda é incerta, mas os esforços do governo para aprovar a medida podem deixar como herança uma conta de ao menos R$ 4 bilhões por ano aos consumidores de energia, segundo cálculo da Abrace, associação que representa grandes consumidores de energia.

Os encargos adicionais foram incluídos em uma MP (medida provisória), publicada no fim do ano passado, que tinha como objetivo destravar os estudos para a privatização da estatal de energia e aprovar medidas que viabilizariam a venda das seis distribuidoras da Eletrobras.

A redação final apresentada pelo relator, Julio Lopes (PP-RJ), na quarta (25), trouxe uma série de alterações, que vão desde o aumento da tarifa de energia de usinas geradoras até a criação de um fundo para pagar por dois anos o salário de funcionários das distribuidoras da Eletrobras caso estes sejam demitidos após a privatização.

O texto ainda será votado no dia 8 de maio por uma Comissão Mista criada no Congresso para analisar a MP, mas a Abrace já planeja questionar judicialmente o desvio de finalidade da medida provisória, afirma o presidente da entidade, Edvaldo Santana.

“A MP original tinha três artigos e três páginas. Agora tem 25 artigos e 15 páginas”, disse ele, que estima um impacto nas tarifas de ao menos 6%.

Uma das alterações questionadas pela associação é o aumento do preço da energia da usina de Angra 3, cujas obras hoje estão paradas.

A medida geraria um impacto de cerca de R$ 1,8 bilhão por ano, afirma Edvaldo.

A elevação da tarifa da usina seria uma forma de viabilizar as obras, segundo uma pessoa que acompanha as negociações para a retomada da construção. O valor, inicialmente fixado durante o governo de Dilma Rousseff, seria muito baixo e teria que praticamente dobrar.

Outra mudança na MP criticada é o aumento do preço do gás natural utilizado em usinas térmicas contratadas no início dos anos 2000. O texto define que o reajuste será arcado pelos consumidores.

O impacto da medida foi calculado em cerca de R$ 2,1 bilhões, segundo um ofício redigido pelo diretor da Aneel (agência reguladora do setor elétrico) Romeu Rufino.

O presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, defendeu a cobrança: para ele, é preferível que o consumidor pague o reajuste, caso contrário, as usinas teriam que ser desativas e, no lugar, seriam acionadas outras térmicas, ainda mais caras.

Para Edvaldo, porém, o aumento de preço deveria ser arcado pelas companhias privadas que operam as usinas.

A MP também traz medidas que podem afetar o orçamento da União. Uma delas é a criação de um novo fundo, para financiar a expansão do sistema de gasodutos no país.

A Abrace ainda não tem um cálculo qual seria o potencial impacto desse fundo, cujos recursos viriam do orçamento federal e de receitas do governo com a comercialização de petróleo e derivados.

Há também uma proposta para a criação de uma conta para garantir que funcionários das distribuidoras da Eletrobras recebam salário por dois anos, mesmo que sejam demitidos, após a privatização das empresas.

Procurado, o deputado Julio Lopes não se manifestou até a conclusão desta edição.