Modelo é visto como solução para a falta de esgotamento sanitário

Marcelo G. Ribeiro – Jornal do Comércio

26/03/2018 – 01h33

Em alta na agenda pública do Rio Grande do Sul, onde são apontadas como solução por Estado e municípios, as Parcerias Público-Privadas (PPPs) voltadas ao saneamento básico seguem a mesma tendência no resto do País. Segundo levantamento da consultoria Radar PPP, há, pelo menos, 19 parcerias vigentes para água e esgoto no Brasil, celebradas desde 2006. Fatores mais recentes – como a escassez de repasses federais para a área, a falta de recursos próprios dos demais governos e a maturidade do modelo – são vistos, também, como incentivos para que mais parcerias do tipo aconteçam no curto prazo.

No Rio Grande do Sul, o projeto mais próximo de se tornar realidade é a PPP da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), voltada à universalização da rede de esgoto em nove cidades da Região Metropolitana: Alvorada, Cachoeirinha, Canoas, Eldorado do Sul, Esteio, Gravataí (que planeja romper concessão da Corsan), Guaíba, Sapucaia do Sul e Viamão. A construção da proposta que vem desde 2011, aguarda a aprovação dos poderes municipais. Além disso, porém, outras cidades que possuem autarquias próprias também tornaram públicas suas intenções de seguirem os mesmos passos. Em Pelotas, por exemplo, foi criada uma Comissão de PPPs pela prefeitura que tem, como um dos objetivos, alcançar uma parceria para o Serviço Autônomo de Saneamento de Pelotas (Sanep). Já a prefeitura de Porto Alegre tenta passar, na Câmara de Vereadores, a autorização para modelar uma PPP na área atendida pelo Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), no que ainda não obteve sucesso.

“Empresas e autarquias acabam não tendo mais acesso àquele dinheiro barato da União ou de banco internacionais, então há, de fato, essa busca por alternativas, e a PPP tem sido uma delas”, analisa o consultor Bruno Pereira, um dos sócios da Radar PPP. Pereira ainda vê que, no saneamento básico em especíco, há outro ponto favorável que é o próprio histórico de operações.

“Não estamos mais criando roda nenhuma. Qualquer governo que queira pensar no tema tem vasto material para ler e visitas técnicas a fazer para tomar uma decisão adequada”, comenta.

O consultor divide a trajetória de PPPs no Brasil em três períodos: o primeiro, de 2005 a 2011, de experimentação, com os primeiros contratos sendo assinados – o mais antigo em água e esgoto catalogado pela consultoria foi rmado pelo governo baiano em dezembro de 2006. Depois, até 2014, teria havido uma fase de consolidação, capitaneada pelos estados e com a adesão de grandes empreiteiras, encerrada pelos efeitos da Operação Lava Jato.

De lá para cá, a atenção tem se voltado aos municípios e a empresas de pequeno porte, cenário que deve ser dominante em 2018. Isso porque o tempo médio para a construção de uma PPP é de 20 meses, de acordo com o levantamento da Radar PPP – não há, portanto, tempo hábil para as gestões estaduais que se encerram neste ano. O sucesso eleitoral de vários prefeitos que defendiam abertamente a alternativa também é um indicativo de aumento no número de parcerias daqui para a frente.

Pereira ressalta que o instrumento ainda é utilizado de maneira irresponsável em alguns casos. Não treinar os gestores, não ser transparente em relação ao modelo e não comunicar quais áreas são prioridade são algumas das falhas apontadas. “Não pode também cair no conto do vigário de empresa que chega e diz que vai entregar o projeto de graça, sem que a prefeitura tenha preparado o seu pessoal para conseguir avaliar o projeto”, acrescenta. Para despertar o interesse de empresas, Pereira ainda elenca que a proposta só deve ser lançada ao mercado após a construção de um consenso mínimo sobre o tema com a sociedade, garantindo segurança jurídica.

Corsan e prefeituras apostam em agilidade na universalização

Não é apenas o cobertor curto nas finanças que ajuda a despertar o interesse em PPPs voltadas à água e, em especial, ao tratamento de esgoto. Por se tratar de um fator de sanidade, o argumento da agilidade na implantação de redes também ganha espaço nos discursos oficiais. “É a eficiência privada sendo apropriada pelo público, o inverso do que pensam”, argumenta o diretor-presidente da Corsan, Flávio Ferreira Presser. Sobre a PPP da Região Metropolitana, o executivo argumenta que, em um contrato de 35 anos de duração, 60% das obras estão concentradas nos primeiros cinco anos, com o objetivo de crescer aceleradamente a oferta de tratamento de esgoto hoje jogado nos rios e, com isso, recuperar os mananciais.

 “A PPP não é objetivo, é meio. O objetivo é levar o serviço à população na sua integralidade”, acrescenta Presser. A universalização deve estar completa em 11 anos, com investimento de R$ 1,6 bilhão da empresa vencedora e mais R$ 500 milhões da própria Corsan. A decisão também foi embasada por um estudo que estima que a economia da PPP em relação à Corsan – caso a estatal fizesse o trabalho sozinha – chega a R$ 1,3 bilhão. “As regras são diferentes, o privado pode negociar o preço com mais abertura, por isso acontece essa diferença”, segundo o diretor-presidente.

A escolha dos municípios se deu pela alta concentração populacional, que torna mais urgente uma solução e, ao mesmo tempo, também joga a favor da viabilidade econômica para o parceiro privado. Não há previsão de aumento de tarifa – as contas só aumentarão para quem passar a ter acesso à rede, porque a tarifa de esgoto só é cobrada de quem efetivamente possui o serviço. A vencedora será remunerada pelo caixa da Corsan, de acordo com a quantidade de esgoto coletado. Metas de qualidade também determinarão o montante dos pagamentos.

Uma das cidades que já aderiu ao acordo, Eldorado do Sul salienta, justamente, a agilidade na universalização. “Nunca vimos nenhuma iniciativa forte apontando para o tratamento de esgoto, então é louvável a iniciativa da Corsan em reconhecer que precisa de investimento privado para resolver o problema”, argumenta o secretário de planejamento, Fábio Leal. Menor dos municípios, Eldorado acredita poder passar de 11% de esgoto tratado para a universalização em menos de 10 anos.

Na Capital, o secretário de Parcerias Estratégicas, Bruno Vanuzzi, argumenta que a meta de universalização do esgoto até 2035 não é factível sem a PPP. “Ainda que o Dmae gere excedente de caixa, é muito distante do que precisaria”, justica, citando estimativa de R$ 2,7 bilhões necessários nos próximos 17 anos. Até 54% do esgoto é tratado atualmente em Porto Alegre. Detalhes de como seria a parceria só serão trabalhados caso a Câmara dê a autorização ao Executivo.

Parceria público-privada – PPP

Um dos modelos de repasse de serviços públicos à iniciativa privada, a PPP é tida como menos radical do que a privatização. A diferença quanto à concessão comum é que, na PPP, o ente privado é remunerado pelo ente público, e não pelo usuário nal por meio de tarifas extras (como acontece com pedágios, por exemplo). Para ser efetivada, é preciso provar que o modelo será mais barato do que a contratação comum. Segundo o consultor Bruno Pereira, isso é possível porque apenas uma empresa é contratada para fazer todo o processo, desde a construção até a operação, e, por isso, há incentivo para que busque racionalizar gastos no longo prazo. Além disso, normalmente é remunerada a partir de metas preestabelecidas.