Por Edna Simão – Valor Econômico

A Caixa Econômica Federal precisa de R$ 25 bilhões de capital apenas para conseguir operar o orçamento de R$ 325 bilhões aprovado pelo conselho curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para o período de 2018 a 2021.

Somente neste ano, o orçamento do fundo dos trabalhadores é de R$ 85 bilhões. Ontem, o presidente Michel Temer sancionou projeto de lei que permite o uso do FGTS para fortalecer o capital da Caixa até o limite de R$ 15 bilhões. A medida vai ajudar no cumprimento das exigências de capital do Acordo de Basileia 3, que entrará plenamente em vigor a partir de 2019.

“Tem uma coisa que sempre digo. A Caixa tem a sua solução de capital. Nós não estamos desenquadrados [Basileia]. Nós não ficaremos desenquadrados. Nada disso. O que a gente tem que entender é que o orçamento do FGTS para os próximos quatro anos é de R$ 325 bilhões. Isso consome capital de qualquer banco em algo em torno de R$ 25 bilhões”, explicou o presidente da Caixa, Gilberto Occhi, ao Valor.

Segundo o último balanço divulgado pela Caixa, referente ao terceiro trimestre de 2017, o índice de capital nível 1 [capital de melhor qualidade] atingiu 9,54% em setembro, com a desaceleração da concessão de crédito. Em junho esse indicador estava em 8,97% e, em setembro de 2016, em 9,43%. Em 2019, os bancos do porte da Caixa terão de atingir índice de capital nível 1 mínimo de 9,5%. Dependendo de exigências adicionais que sejam feitas pelo Banco Central (BC), esse conceito pode ficar ainda mais restritivo.

Para ajudar no cumprimento dessas regras prudenciais, o projeto de lei, sancionado ontem pelo presidente Temer, permite a troca de dívida do banco público com o FGTS por bônus perpétuos, títulos de dívida sem vencimento que em geral pagam taxas de juros mais altas, até o limite de R$ 15 bilhões. A operação depende de aprovação do conselho curador do FGTS e a contabilização desse valor como capital de nível 1 pela Caixa precisa ser autorizada pelo BC. A ideia é fazer a substituição por bônus perpétuos das dívidas com vencimento superior a 15 anos.

Além dessa transação que pode dar um alívio de até R$ 15 bilhões à instituição, Occhi explicou que o banco poderá adotar outras medidas de reforço de capital até 2021 já citadas em ocasiões anteriores, como a venda de carteira de imóveis retomados. Ele conta ainda com o resultado positivo da instituição no ano passado, que deverá ser o maior da história.

O presidente da Caixa destacou que, se o banco deixasse de atuar com recursos do FGTS, não teria necessidade de fortalecer seu capital. O mesmo aconteceria se focasse em operações que demandam menos aporte de capital, como é o caso da faixa 1 (público de menor renda) do programa Minha Casa, Minha Vida, em que o risco é da União. “O problema da Caixa não é capital, mas cumprir esta política”, explicou, acrescentando que o banco público opera 95% do orçamento do FGTS e que as outras instituições, mesmo tendo autorização para atuar com o recurso, não o fazem devido à exigência dessa “monstruosidade de capital”.

Na avaliação de Occhi, se o governo e o FGTS querem que a Caixa continue operando como está, é preciso “discutir a relação”. “O que queremos dizer para todos é que a gente deve parar de falar que a Caixa tem um problema de capital. A Caixa não tem problema de capital, igual falei em junho de 2016 quando assumi a presidência”, frisou, reforçando que a Caixa é um banco sólido.

Segundo ele, a operação que a Caixa pretende fazer com o FGTS não gera prejuízo ao fundo. “Não estamos pegando recurso novo. Estamos transformando parte da minha dívida, [para] que aplique em habitação, saneamento e infraestrutura, e dando a ela esta característica [bônus perpétuos] e dando a remuneração. Não estou pegando sem pagar. Essa é uma operação tradicional”, disse.

Mesmo com a sanção do projeto de lei por Temer, o presidente da Caixa afirmou que vai cumprir o acordo feito com o Tribunal de Contas da União (TCU) e aguardar a manifestação do órgão para apresentar a proposta ao conselho curador do FGTS, que precisa aprovar a medida para que ela possa ser realizada. Occhi contou que está conversando com o TCU e as “convicções estão sendo formadas”. “A gente espera que seja rápida a manifestação do TCU. Mas nós firmamos um compromisso com o TCU de que jamais colocaremos esse assunto para deliberação do conselho curador [do FGTS] sem antes o TCU se manifestar. Esse é um compromisso que eu cumprirei até o final. Vamos aguardar”.

Para Occhi, a sanção do projeto de lei vai dar mais segurança para que os conselheiros do FGTS aprovem a operação. Alguns, segundo ele, estavam entendendo que haveria uma desvirtuação dos recursos do fundo dos trabalhadores, o que, conforme o executivo, não acontecerá. Pela legislação vigente, o recurso do fundo só pode ser destinado para investimentos em habitação, saneamento básico, infraestrutura e mobilidade urbana.