Por Estevão Taiar – Valor Econômico

Depois de quase três anos de recessão, 2017 deve ficar marcado por uma combinação rara para a economia brasileira: atividade em crescimento, juros baixos – no menor patamar histórico – e inflação sob controle – abaixo até do intervalo inferior da meta.

Esse já era um cenário que de alguma maneira se desenhava em janeiro do ano passado, mas as variáveis apresentaram surpresas positivas quase semanalmente, como ilustram as projeções do boletim Focus do Banco Central (BC). O Focus apresenta a cada sete dias as estimativas de aproximadamente 120 instituições financeiras e consultorias.

“A inflação foi a principal dessas surpresas”, diz Nelson Augusto Rocha, presidente do Banco Ribeirão Preto, que em quatro meses esteve entre as cinco instituições com maior índice de acerto das projeções de médio prazo. Na primeira semana de 2017, a estimativa mediana do Focus para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) estava em 4,81%, acima da meta de 4,5%.

Fatores como a safra recorde de grãos e a queda da inflação de serviços levaram os preços a crescerem, provavelmente, no menor ritmo desde 1998, quando o IPCA ficou em 1,65%. A projeção mediana do Focus da última semana de dezembro para o indicador era de 2,78%, abaixo do piso da meta, de 3%. O IPCA completo de 2017 será divulgado dia 10.

A queda da inflação abriu espaço para o recuo dos juros. No começo de janeiro, o mercado projetava que a Selic terminaria o em 10,25%. Mas na semana seguinte as projeções começaram a cair, e a taxa básica encerrou 2017 em 7%, o menor patamar histórico.

“A inflação menor também permitiu a melhora do consumo, que puxou o crescimento da economia”, diz Juan Jensen, sócio da 4E Consultoria. Entre o começo e o fim de 2017, a projeção mediana para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) também aumentou, saindo de 0,5% de 0,98%. “Do lado da oferta, a surpresa veio da indústria automobilística e eletroeletrônica, que nos últimos meses apresentou números chineses”, diz Rocha, do Ribeirão Preto.

O momento de maior turbulência para a atividade durou quase três meses, entre o fim de maio e meados de agosto. Nesse período, a projeção mediana de crescimento do PIB caiu de 0,5% para 0,34%, patamar em que permaneceu por sete semanas. Com o fim da fase mais intensa da turbulência política, a estimativa do mercado voltou a crescer, até atingir os 0,98% registrados no fim de dezembro.

Na esteira da melhora do cenário de 2017 vieram projeções mais favoráveis também para 2018. Desde janeiro, a estimativa do Focus para a inflação deste ano caiu (de 4,5% para 3,96%), assim como a da Selic (de 9,63% para 6,75%), enquanto a projeção do PIB cresceu (de 2,3% para 2,68%).

Os fatores que mais podem atrapalhar a transformação desses cálculos são o fim do cenário externo favorável e, principalmente, a eleição presidencial, dizem os analistas. “Tudo isso deixa uma dúvida na cabeça dos investidores da economia real”, diz Felipe Carvalho, economista da Absolute Investimentos, que também ficou quatro meses entre as cinco instituições que mais acertaram as projeções de médio prazo.