Por Ribamar Oliveira e Fabio Graner – Valor Econômico

16/04/2018 – 05:00

O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, reconheceu, em entrevista ao Valor, que a situação envolvendo a ação militar na Síria feita por Estados Unidos, Reino Unido e França representa um risco para a economia brasileira. Mas ele salientou que o Brasil está em condições de enfrentar uma turbulência nos mercados decorrente de uma piora na incerteza internacional.

“Historicamente, na medida em que a percepção de risco aumenta, capitais se movem para comprar títulos públicos americanos e economias de países emergentes podem ser afetadas”, explicou. “Mas o Brasil está preparado neste momento. A economia retomou o crescimento, a inflação está bem baixa e temos taxa de câmbio flexível. Importante também frisar que nosso elevado nível de reservas internacionais faz com que uma eventual saída de capital não cause nenhum tipo de problema de solvência em dólares”, afirmou, destacando a boa saúde do setor bancário brasileiro, demonstrada na última recessão.

Na entrevista, Guardia destacou que o leilão do excedente de petróleo da área da cessão onerosa não será viável sem um entendimento prévio entre a União e a Petrobras em relação aos valores pagos pela empresa ao governo em 2010, quando ela recebeu o direito de explorar cinco bilhões de barris.

“A minha visão é mais pragmática, de business mesmo”, disse, reforçando que esse assunto é uma de suas maiores prioridades, junto com a privatização da Eletrobras. “Acho que não é viável, pois ninguém vai querer colocar dinheiro em um negócio desse, com conflito com a Petrobras”, afirmou.

O ministro informou que uma decisão sobre a revisão da cessão onerosa sairá até o dia 17 de maio. Guardia não quis dizer se, na avaliação do governo, a Petrobras é credora na cessão onerosa e nem quanto é o valor em discussão. Ele explicou também que o atual governo não vai gastar o dinheiro que será arrecadado com o leilão do excedente da cessão onerosa. E comentou que é preciso cumprir o teto de gastos da União, fixado para este ano.

“Nós estamos dois a três bilhões abaixo do limite de despesa permitido”, informou. “Então, não podemos gastar esse dinheiro [que será obtido no leilão]. Isso vai para o resultado primário, que ficará bem melhor neste ano”, disse Guardia.

O ministro explicou que o dinheiro levantado com o leilão, que poderá ser muito significativo, ficará no caixa do Tesouro e poderá ser usado, no próximo ano, para ajudar o novo governo a cumprir a chamada “regra de ouro” das contas públicas, cujo déficit estimado para o ano que vem é de R$ 254,3 bilhões. “O dinheiro do excedente da cessão onerosa é necessariamente para o próximo governo”, disse.

Outro ponto ressaltado por ele é a tentativa de atacar o problema do ICMS. Guardia defendeu a padronização de alíquotas de alguns produtos entre os Estados, de obrigações acessórias e regras de crédito tributário. Ele não demonstrou otimismo sobre mexer também na alíquota interestadual do tributo.

“Nós vamos falar de alíquota interestadual? Vamos. Essa é a discussão difícil. Agora, vamos tentar botar regras de simplificação de obrigações acessórias, de tentar ter alguma uniformidade de alíquotas entre os diversos estados da federação”, disse Guardia. “Eu quero propor. Se acharem que a discussão não tem espaço, tudo bem.”

Guardia rejeitou a crítica de que o movimento poderia levar a mais uma centralização de poder, gerando perda para os governos estaduais. “Não é poder para a União. O que a gente está querendo dizer é o seguinte: faz a gestão do ICMS dentro de alguns outros limites. A gente não pode esquecer que tem o setor privado na outra ponta pagando esse imposto com custo absolutamente inaceitável”, disse. “Tem que começar colocar o dedo na ferida.”

No pacote tributário, Guardia também reforçou o interesse de encaminhar o projeto de lei que mudará a tributação do PIS/Cofins, em preparação no governo, permitirá que os setores de serviço que hoje estão no regime cumulativo do tributo, permaneçam nele. Mesmo assim, Guardia informou que a transformação do PIS/Cofins em um imposto sobre valor adicionado (IVA) atingirá a maior parte da economia do país. “Achamos que 85% da economia estará no novo sistema”,

afirmou. Os setores que pagam pelo regime não cumulativo terão, segundo Guardia, “uma brutal simplificação”.

O ministro salientou que a mudança será neutra do ponto de vista da carga tributária, mas reconheceu que o impacto será diferenciado entre os setores. “Essa é a dificuldade da discussão”, acrescentou, lembrando ainda que a mudança levará a um aumento da alíquota nominal. “Não dá para fazer mágica.”

Guardia minimizou a queda recente nas projeções de mercado para o crescimento da economia brasileira. E reconheceu que é “óbvio” que o país precisa crescer mais do que está projetado por governo e mercado, mas salientou que, para isso, é preciso fazer reformas. “Se a gente não avançar nas reformas, nem 2,8% vamos crescer. Nosso PIB potencial é 2,3%, 2,4%”, disse.