Atraso na execução de projetos na área condena milhões de brasileiros a viverem em condições inadequadas

O Estado de S. Paulo

14 Outubro 2018 | 03h00

A decisão do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de aumentar o limite para o financiamento de projetos na área de saneamento básico contribui para amenizar uma das principais dificuldades que vêm retardando o cumprimento das metas do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab). Criado em 2013, o plano previa que até 2033 o Brasil deveria alcançar a universalização dos serviços de abastecimento de água potável, de coleta e tratamento de esgoto sanitário, de manejo dos resíduos sólidos e de drenagem de águas pluviais. Para alcançar essa meta, foram estimados investimentos anuais de cerca de R$ 20 bilhões. A média dos investimentos efetivos nos últimos anos, porém, mal tem alcançado a metade desse valor, o que indica grande necessidade de novas aplicações, as quais estão em boa parte condicionadas à disponibilidade de financiamentos para projetos na área.

O BNDES elevará de 80% para 95% do valor do projeto o limite de financiamento para saneamento básico. Desse modo, estende para todos os projetos de saneamento a medida que havia aplicado, em junho passado, aos projetos incluídos no programa Avançar Cidades – Saneamento, criado pelo Ministério das Cidades para financiar projetos na área. Também foram estendidas para os demais contratos as vantagens que já se aplicavam a financiamentos a projetos do Avançar Cidades. As operações terão juros de 0,9% (para obras de esgoto) e 1,3% ao ano (para obras de água), mais a Taxa de Longo Prazo (TLP). Também o prazo para a quitação do empréstimo está entre os melhores oferecidos pelo BNDES.

Segundo o banco, era grande o número de empresas privadas interessadas em obter financiamentos para projetos de saneamento básico, mas que não dispunham de 20% de capital próprio para executá-los, como se exigia até agora. Por isso, deve haver aumento expressivo no total dos empréstimos. Há alguns meses, o banco previa que o volume de financiamentos para o saneamento básico neste ano chegaria a R$ 1,5 bilhão, o dobro dos R$ 725 milhões liberados em 2017. As novas regras poderão acrescentar R$ 2 bilhões ao volume anual de operações. Também a Caixa Econômica Federal é atuante nesse segmento.

O financiamento é considerado fundamental para a execução de obras de saneamento básico, pois elas exigem investimentos pesados na primeira fase, mas os contratos de concessão são de longo prazo, podendo chegar a 30 anos.

Novas regras têm estimulado investidores privados a atuar na prestação de serviços públicos de saneamento básico. Com a vinda desses investidores, entre eles grandes corporações internacionais, espera-se que mais recursos sejam aplicados nesse setor ainda muito carente.

O atraso na execução de projetos de saneamento condena milhões de brasileiros a viverem em condições inadequadas. A falta de rede de água tratada e de sistema de coleta de esgotos propicia a proliferação de diversas moléstias, prejudicando principalmente a população infantil. Levantamentos recentes mostram que, dos 5.570 municípios do País, apenas cerca de 1,6 mil dispõe do serviço de tratamento de esgoto. São cerca de 100 milhões de pessoas sem acesso a coleta de esgoto e mais 35 milhões sem dispor de água potável. Se o Plansab estivesse sendo executado de acordo com o cronograma elaborado quando de sua aprovação, hoje 93% da população já teria acesso a água tratada e 76%, a coleta de esgoto.

A crise causada pela irresponsável política econômica do governo Dilma Rousseff foi particularmente nociva para o saneamento básico. Os investimentos na área, que já eram insuficientes, caíram em média 9% ao ano entre 2014 e 2016, quando a recessão foi mais aguda. Fazer avançar os projetos já decididos pelos investidores privados e estimular a entrada de novos participantes no setor, indispensável para o cumprimento das metas do Plansab, exigirão do próximo governo pelo menos a manutenção de regras adequadas e claras para as concessões dos sistemas de saneamento básico.