Por Luis Guedes – publicado no Valor Econômico

O mais tradicional índice do mercado de ações brasileiro, o Ibovespa, voltou a superar os 73 mil pontos, patamar que desde 2008 não era atingido, com uma rentabilidade acumulada de mais de 25% neste ano.

Muitos investidores vêm se questionando se há um otimismo exagerado no mercado dado todo o imbróglio político e a fraqueza da economia.

Se fizermos uma rápida análise dos acontecimentos, perceberemos que as condições necessárias para tal desempenho do mercado têm sido reforçadas ao longo dos últimos trimestres. Primeiramente pelo âmbito global, onde a recuperação das economias desenvolvidas vem ocorrendo de forma gradual e consistente, sem pressões inflacionárias, o que favorece a normalização dos juros sem sobressaltos, a manutenção da liquidez e a baixa aversão ao risco.

No Brasil, após o impeachment de Dilma Rousseff, o retorno à racionalidade econômica derrubou significativamente a percepção de risco e abriu espaço para que o Ibovespa apresentasse em 2016 um retorno de 38,9%. Medidas como a do teto dos gastos, a reforma trabalhista, a lei das estatais, a nova Taxa de Longo Prazo (TLP) do BNDES e o anúncio do programa de privatização, evidenciam esse novo ambiente econômico.

A reconquista da credibilidade pela atual equipe econômica aliada ao fraco desempenho do PIB brasileiro nos últimos anos permitiu a reancoragem das expectativas da inflação e abriu caminho para a queda da taxa real de juros de forma consistente, diferentemente daquela observada em 2011 e 2012, quando as expectativas de inflação estavam totalmente desancoradas.

Indicadores recentes já apresentam sinais de que a economia começa a ganhar tração de forma difundida pelos setores, puxada em especial pelo consumo, que se beneficia da desalavancagem financeira das famílias e do ganho real de salários, além do recente impulso dado pelo uso do FGTS.

Entretanto, nem todas as empresas vêm conseguindo capturar essa recuperação e melhorar seus resultados. Destacam-se aquelas que aproveitaram os duros anos de recessão para ajustar suas operações a uma nova realidade de demanda e que, agora, começam a colher os frutos proporcionados pela desalavancagem financeira e pela alavancagem operacional que lhes garantem vantagens imprescindíveis na ainda sensível recuperação da economia.

Isso pode ser atestado pelos resultados divulgados neste primeiro semestre de 2017, nos quais várias empresas superaram os lucros previstos pelo mercado e deram início a um ciclo de revisão de resultados que deve continuar ao longo dos próximos meses, dado que muitos investidores ainda estão relutantes em adotar premissas mais condizentes com um cenário de reversão de ciclo econômico.

A combinação de um cenário externo favorável, ainda provedor de liquidez e em busca de oportunidades, com um cenário doméstico de reversão de ciclo econômico, em que grande parte dos economistas começa a acreditar que o PIB para 2018 será superior a 2,5%, a inflação será inferior a meta do Banco Central, a taxa de juros real ficará em cerca de 3,0% e o câmbio será estável, é uma combinação que há muitos anos não observávamos.

Se nos arriscarmos a adicionar a esse cenário a eleição de um presidente em 2018 que garanta a continuidade da agenda de reformas que vem sendo implementada, poderemos vivenciar um longo ciclo de valorização de ativos que levará o Ibovespa a superar, e muito, os 70 mil pontos.

Luis Guedes é superintendente de renda variável da Bram

E-mail: bram@bram.bradesco.com.br

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