Por Rodrigo Rocha – Valor Econômico

09/07/2018 – 05:00

A assinatura da medida provisória (MP) que altera o marco legal do saneamento básico surpreendeu o setor negativamente. Entidades que representam trabalhadores e empresas estaduais se posicionaram contra o texto assinado na sexta-feira pelo presidente Michel Temer e pelo ministro das Cidades, Alexandre Baldy. “O governo joga contra o povo brasileiro”, afirma Roberval Tavares, presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), que representa trabalhadores do setor. Ele era um dos principais críticos da versão que vinha sendo discutida entre governo e entidades. “Essa MP pode desestruturar o setor de saneamento do país.”

O representante da Abes afirma que informações vindas do Ministério das Cidades apontam que a medida mantém a mesma lógica que vinha sendo discutida desde o ano passado.

Entre as diversas regras que serão alteradas pela MP, a mais polêmica é o artigo que obrigará os municípios a realizarem consulta pública na ocasião da renovação dos contratos com as empresas estaduais de saneamento. A leitura de parte do setor é que a mudança privilegiaria municípios que têm operação superavitária, deixando apenas cidades com operações menos lucrativas nas mãos das companhias estaduais, quebrando a lógica do chamado subsídio cruzado.

As companhias estaduais do setor pretendem, inclusive, questionar na Justiça o projeto, afirmou Roberto Tavares, presidente da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe). A intenção da entidade é questionar a constitucionalidade da MP. “Uma MP, para ser assinada, tem que justificar relevância e urgência. Concordamos com a relevância do assunto, mas qual a urgência de dizer agora que os municípios têm de consultar o setor privado?”, questiona.

O representante das estaduais afirmou que vinha conversando para realizar uma reunião com o governo e as empresas privadas, com quem vinha costurando um acordo para retirar alguns pontos mais polêmicos do texto. “Se fosse um governo que gostasse de debate, poderia desistir de alguns trechos e deixar a parte boa na MP.”

A cerimônia de sexta-feira foi realizada no último dia possível para o presidente Michel Temer realizar anúncios públicos, devido ao prazo eleitoral. Segundo o governo, o objetivo é modernizar o setor.

“A MP fere a lógica de que o poder concedente é o município”, critica o representante da Abes. “Fazer isso em um dia de Copa, com Judiciário em recesso, além de antidemocrático, não conta com bom senso. É um desrespeito.”

A assinatura da medida encerra um debate de quase um ano. A última reunião formal colhendo sugestão de todos os representantes do setor foi realizada em novembro, ainda na gestão de Bruno Araújo no Ministério das Cidades. Desde então, o governo vinha dando sinais de que não pretendia fazer grandes alterações no conteúdo, mas abrindo a possibilidade de a mudança ser feita por projeto de lei, não como MP.

Além da Justiça, as entidades também devem procurar o Congresso, para evitar que o texto da MP seja aprovado.