Por Mariana Muniz – Valor Econômico

04/09/2019 – 05:00

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, afirmou que o modelo de privatizações de estatais é preciso ser encarado como a “execução de uma política”. Foi dele a decisão, em janeiro deste ano, que autorizava a venda da Transportadora Associada de Gás S.A (TAG), subsidiária da Petrobras – entendimento que foi mantido pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).

“Hoje o momento político da administração pública é a favor da privatização. Eu decidi [sobre a venda da TAG] porque a legislação permite que as subsidiárias sejam vendidas. É preciso entender que essa é a execução de uma política. Esse plano de governo está em conformidade com a ordem jurídica, com a Constituição, com a lei? Se não fere, tem que ter a liberdade de executá-lo”, disse.

Na ocasião, Noronha suspendeu decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) que impedia a venda de 90% das ações da TAG. Para ele, barrar o desinvestimento afetaria a confiança do mercado quanto às perspectivas do setor de petróleo e gás brasileiro.

Na semana passada, o ministro completou um ano à frente da presidência do STJ, tribunal que finalizou recentemente um caso que durou dez anos e deixava dúvidas sobre o pagamento pela Eletrobras de juros sobre empréstimos compulsórios.

Como resultado, foi definido que a estatal terá que pagar 6% ao ano.

“Esse é o meu entendimento. Nada é proibido. A Constituição não segura nada. No caso da privatização dos Correios, por exemplo, mudou a Constituição, pode vender”, comentou.

Às voltas com a tarefa de diminuir o número de processos do tribunal, Noronha criticou o papel que os governos municipais, estaduais e o próprio governo federal têm na sobrecarga do Judiciário.

“Você olha o INSS, a quantidade de indeferimento de aposentadorias requeridas. Nós temos um alto grau de provimento do recurso [sucesso] dos aposentados. Tem algo errado, é preciso consertar lá na administração essas distorções. O Judiciário não pode ser o desaguadouro para resolver o problema de ineficiência dos órgãos administrativos”, apontou.

Ele foi duro nas críticas feitas ao pacote anticrime, do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. “Eu não acho que o pacote tenha sentido ainda. Porque é que a Câmara tem que votar um projeto feito pelo Executivo? A Câmara é soberana, quem legisla são os deputados e os senadores”, afirmou.

O presidente do STJ também não economizou nas críticas aos “exageros” do que chamou de “acerto de contas” promovido por alguns pontos do projeto de Lei do Abuso de Autoridade, que aguarda sanção presidencial.

“Eu acho que a lei precisava ser atualizada, modificada. Mas há alguns pontos que exageram. Por exemplo, toda essa parte de crime contra prerrogativa de advogado [a criminalização da violação das prerrogativas dos advogados]. É uma figura se não intimidatória, ao menos absurda”, disse.

Noronha afirma ter certeza de que Jair Bolsonaro – cuja atuação elogiou – vai vetar “tudo aquilo que parece um acerto de contas, uma maneira de responder a alguma contrariedade, tem que ser barrado”.

O presidente do STJ também disse concordar com o posicionamento do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, sobre a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância – defendendo uma análise caso a caso. Em 2016, Toffoli propôs que a prisão ocorresse depois de condenação no STJ, que funcionaria como uma terceira instância.

“Eu acho que essa proposta calibra um pouco. Eu penso que a prisão após condenação em segunda instância não deve ser tomada como um entendimento absoluto. Naqueles casos em que há dúvida, eu acho que o juiz pode flexionar. Naqueles casos que parece ao juiz razoável a possibilidade de provimento do recurso, não vejo razão para o juiz não suspender a eficácia da decisão até o julgamento do tribunal superior.”