Especialistas discutem recomendações de instituto para a melhoria das tarifas da Sabesp

Eduardo Sombini – FOLHA UOL
SÃO PAULO

Até especialistas têm dificuldade em entender as variáveis da equação da tarifa de água e esgoto paga pela população. A conta é ainda menos compreensível para os cidadãos comuns.

O diagnóstico foi compartilhado por participantes do debate “A tarifa de água e esgoto como instrumento para a universalização do saneamento e a promoção da segurança hídrica”, realizado pelo IDS (Instituto Democracia e Sustentabilidade) com apoio da Folha na manhã desta terça-feira (24), no auditório do jornal (centro de SP).

Para o vice-presidente do instituto, João Paulo Capobianco, o modelo de cobrança de empresas de saneamento precisa ser mais justo e transparente. “Não é um problema técnico. A conta de água e de esgoto é uma questão de cidadania”, afirmou.

“A relação com esse bem finito e vital para a sociedade não pode se traduzir apenas em uma conta que as pessoas pagam sem saber o que estão pagando, sem saber se é justa ou não.”

O instituto apresentou estudo inédito com 23 propostas de mudança da tarifa da Sabesp, que incluem aumentar a abrangência da tarifa social, destinada a famílias de baixa renda, e criar novas faixas de consumo, com valores progressivos.

Stela Goldenstein, ex-secretária de Meio Ambiente do município e do estado de São Paulo e coordenadora do 2030 Water Resources Group no Brasil, argumentou que a tarifa deve ser vista como expressão de uma política pública.

“Quando as agências [reguladoras] estão definindo uma tarifa, não estão simplesmente regulando um contrato comercial, mas definindo como a sociedade vai auferir um direito essencial”, disse.

Em sua avaliação, há questões sociais e ambientais que precisam ser discutidas com transparência na escolha de modelos de cobrança.

A geógrafa citou o subsídio cruzado territorialmente —em que os serviços de água e esgoto em municípios mais pobres são financiados pela tarifa de outras cidades— e a importação de água de outras bacias hidrográficas como temas que devem ser incorporados ao debate.

Carlos Roberto de Oliveira, diretor da agência das bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jaguari (Ares-PCJ, no interior de São Paulo) e representante da Abar (Associação Brasileira de Agências de Regulação), afirma que, para aumentar o peso de critérios técnicos nos modelos de cobrança de empresas de saneamento, é preciso universalizar os órgãos reguladores do setor em todos os municípios do país.

Segundo ele, há 1.850 deles sem agências reguladoras, o que favorece o uso de critérios políticos na definição das tarifas e dificulta o desenho de modelos de cobrança adequados tecnicamente. Nesses casos, “é o prefeito que define por decreto o valor do reajuste de água e pode decidir não aumentar o valor em ano eleitoral”.

Oliveira também tratou das dificuldades de articulação entre o planejamento municipal e a prestação de serviços por concessionários de abrangência regional, como as companhias estaduais.

Os municípios devem aprovar planos municipais de saneamento para ter acesso a financiamentos federais, com diretrizes e metas de investimento, mas as políticas tarifárias dessas empresas podem ir de encontro às propostas locais, comprometendo sua viabilidade, afirmou.

Goldenstein, do 2030 Water Resources Group, ponderou que muitos municípios brasileiros são frágeis institucionalmente e têm dificuldades técnicas e gerenciais para elaborar projetos e operar sistemas de saneamento. Capobianco e Oliveira se mostraram mais favoráveis a iniciativas de descentralização.

O gerente de águas da The Nature Conservancy Brasil, Samuel Barreto, ressaltou que é preciso mudar a lógica “do ponto de captação para frente”, dominante no setor de saneamento. O biólogo considera importante incluir na estrutura tarifária formas de financiamento dos reservatórios que garantem a disponibilidade hídrica. “Nosso modelo é sempre degradar e buscar outro manancial.”

“A conservação de mananciais gera um serviço ambiental. A redução dos sedimentos ajudam a diminuir o custo na estação de tratamento de água, eventualmente gerando redução de custo na tarifa.”

O incentivo à redução de perdas nas redes de distribuição de água, que alcançam 70% em alguns municípios do Brasil, segundo Barreto, também foi objeto de discussão.

Stela Goldenstein argumentou que as tarifas devem prever investimentos para renovar as redes antigas e diminuir vazamentos.

Para Capobianco, do IDS, mecanismos que beneficiam a troca de torneiras e outros equipamentos domésticos para reduzir perdas são interessantes do ponto de vista econômico.

“A Austrália enfrentou uma crise hídrica e investiu maciçamente na mudança dos equipamentos. Pôs na tarifa e gerou novos negócios, com empresas privadas oferecendo serviços de modernização.”