Por Fabio Graner, Valor Econômico 

O nível da despesa federal deve encerrar o governo Temer praticamente no mesmo nível recebido do governo Dilma Rousseff, mesmo com a vigência do teto de gastos. Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o gasto federal deve terminar 2018 próximo, possivelmente até acima, dos 19,4% do PIB verificados em 2015.

O último relatório bimestral apontava que a despesa fecharia 2018 em 20% do PIB (mesmo nível do fechamento de 2016), mas a execução efetiva coloca esse indicador em 19,5% nos últimos 12 meses até julho, patamar mais provável para o fechamento do ano.

Mesmo para 2019, quando o governo projeta uma queda da relação entre a despesa e o tamanho da economia, a proposta orçamentária prevê 19,3% do PIB, um recuo discreto ante o resultado verificado em 2015.

Se não foi suficiente para reduzir o nível de gasto no Brasil, é verdade também que o teto conseguiu ao menos estabilizar a trajetória dessa rubrica, que vinha subindo de forma quase ininterrupta por quase duas décadas.

A continuidade da expansão das despesas obrigatórias em um ambiente de desempenho do PIB abaixo do desejável ajudam a explicar por que a despesa, apesar da vigência do teto, não caiu.

Para compensar o crescimento de gastos previdenciários e de pessoal, o governo teve que ajustar naquelas rubricas sobre as quais tem controle, como investimentos. Segundo dados da Instituição Fiscal Independente (IFI), essa despesa deve encerrar 2018 em cerca de metade da média verificada entre 2010 e 2014, período em que os investimentos tiveram sua execução mais elevada na história recente.

Também deve se ressaltar que o governo Michel Temer fez em 2016, quando enviou a proposta, um forte aumento de despesas, completando o processo de regularização de gastos que estavam represados sob a administração de Dilma Rousseff. Assim, ampliou também o ponto de partida do teto, que entrou em vigor efetivamente em 2017.

O ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa, em recente análise publicada pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), aponta que houve expansão fiscal no governo Temer, mas em uma espécie de “sanfona”, na qual o gasto subiu em 2016, teve impulso negativo em 2017 e voltou a subir neste ano.

“Apesar da composição desfavorável à sustentação do crescimento, devido à grande redução do investimento público, a expansão fiscal sob Temer foi correta do ponto de vista macroeconômico. Mais especificamente, o contexto econômico de 2016, com queda do PIB e redução da inflação, indicava ser necessário uma flexibilização fiscal no curto prazo para estabilizar a renda e o emprego”, diz Barbosa.

Ele também analisou a despesa recorrente, excluindo alguns gastos extraordinários, e chegou à conclusão de que, por esse critério, o cenário provável é que a despesa sob o governo Temer encerre o ano 0,7 ponto porcentual do PIB acima de 2015, último ano completo de Dilma.

O diretor da IFI Gabriel Leal de Barros aponta que a proposta do teto de gasto foi decisiva para permitir uma política fiscal expansionista na fase aguda da recessão, além de levar a uma queda nas taxas de juros diante da expectativa de limite para o crescimento dos gastos e viabilizar uma estratégia gradualista de correção das contas públicas.

“A instituição da regra de gasto substituiu de maneira bem-sucedida a perda de confiança dos agentes econômicos quanto à condução da política fiscal, com reflexos positivos sobre a estrutura a termo da taxa de juros”, salientou.

Ele salienta que a regra do teto, embora não resolva todos problemas fiscais do país, tem também o mérito de levar a uma discussão mais clara sobre prioridades e necessidades de reformas. E demonstra preocupação com os riscos de a medida não ter continuidade no próximo governo, o que causaria uma elevação na curva de juros e forçaria o país, na prática, a sair da estratégia de ajustamento gradual para um ajuste forte no curto prazo.

O especialista em contas públicas José Roberto Afonso, que também é professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e pesquisador do Ibre, lembra que a trava colocada pelo teto de gastos foi definida para valer apenas em 2017, permitindo ao governo antecipar pagamentos para 2016, atenuando os efeitos da medida no curto prazo.

“O mais comum na história legislativa, e a luz do bom senso, é adotar como ‘data de corte’ uma que já tenha se passado antes de a medida ter sido aprovada e, se possível, antes até de ser proposta. Pitorescamente, a data de corte dessa emenda foi futura, ou seja, adotou como base um exercício que ainda estava em curso. Isso permitiu um planejamento de pagamentos, sendo o mais conhecido a antecipação do que normalmente seria inscrito em restos a pagar. De modo que acabou por se congelar no teto”, disse.

O economista também apontou também as exceções em medidas de aumento de gastos ignorando as regras constitucionais e o bom senso. “Como tal, a questão é menos fiscal em si e se tornou mais um problema da democracia brasileira”, disse.