Por Raphael Di Cunto, Andrea Jubé e Eduardo Campos – Valor Econômico

06/04/2018 – 05:00

Na tentativa de capitanear uma agenda econômica própria para sua candidatura à Presidência, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pautará para votação em plenário na próxima semana projeto de lei que institui a autonomia de fato para o Banco Central (BC), com mandato para o presidente e diretores da instituição, que só poderiam ser demitidos por “ineficiência” se isso fosse aprovado pelo Senado.

O assunto, polêmico, foi tema da campanha eleitoral de 2014 e deve voltar agora. Maia e Temer já defenderam a proposta, rechaçada pelo PT e com restrições no PSDB. O líder do governo no Senado, Romero Jucá (MDB-RR), esboçou versão do texto que ampliaria a função do BC para além do controle da inflação, incorporando também a busca pela geração de emprego, mas o assunto não avançou entre os senadores.

O projeto negociado por Maia com Banco Central e os Ministérios da Fazenda e do Planejamento, que entrará na pauta a partir de terça-feira, deixa de lado essa questão do emprego e estabelece duas atribuições para o BC: garantir a estabilidade de preços e a estabilidade financeira do país.

A proposta será um texto substitutivo a um projeto de 1998, do próprio Executivo, que deve ter como relator em plenário o deputado Celso Maldaner (MDB-SC). Maia pretendia usar um projeto de sua própria autoria – ele apresentou proposta em 2003 -, mas desistiu porque, nesse caso, não poderia presidir a sessão. Além disso, ao usar projeto encaminhado pelo próprio governo, afasta as discussões sobre vício de iniciativa.

O texto que será apresentado no plenário estabelece mandato de quatro anos para o presidente do BC, que assumirá em 1º de março do segundo ano de governo do presidente da República, a partir de 2020. O último ano do mandato, portanto, coincidirá com o primeiro do próximo presidente da República.

Os dirigentes serão sabatinados pelo Senado após indicação do presidente e, após aprovados, só poderão ser demitidos em três casos: por “comprovado e recorrente desempenho insuficiente”, quando apresentarem falta grave, passível de demissão pelo código dos servidores públicos, ou por condenação transitada em julgado (sem chance de mais recursos) por corrupção, crimes contra o sistema financeiro ou improbidade administrativa.

Nos casos de ineficiência ou falta grave, a demissão só ocorrerá se aprovada por pelo menos 41 dos 81 senadores. O presidente e diretores também poderão sair a pedido ou em caso de enfermidade que impossibilite o trabalho. É permitida uma recondução para o cargo e os oito diretores serão indicados em escalonamento, dois a cada ano, com mandatos de quatro anos.

No Palácio do Planalto, cada vez mais distante do presidente da Câmara por causa de divergências eleitorais – Temer também pretende concorrer à Presidência em outubro -, a ordem é trabalhar contra o projeto de Maia e defender uma outra versão discutida na Casa Civil.

A crítica no governo é que a autonomia plena seria arriscada diante das experiências com a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal. Avalia-se que a isso poderia transformar o BC numa “nova PGR”, com conseqüências “inimagináveis”. A depender do dirigente da autoridade monetária, há receio, por exemplo, de um congelamento do câmbio, com reflexos drásticos na política econômica.

Maia ressaltou que a proposta apresentada será a base para a discussão no plenário e ainda pode ser alterada, mas defendeu que a estabilidade da política fiscal garantirá, junto com a aprovação da adesão automática ao cadastro positivo, juros menores para os consumidores na ponta. “A posição de ser contra mostra um certo radicalismo do governo, poderia negociar através dos líderes. Vou continuar tocando a minha [versão], que foi bem negociada com economistas do governo e da academia”, disse.

O assunto também divide o Congresso. O PT já chegou a acenar com mandatos para o BC no início do governo Lula, mas adotou a autonomia operacional com o argumento de que a política fiscal é de responsabilidade do presidente eleito. O PSDB não tem posição clara, mas alguns de seus principais líderes já criticaram a tese dos mandatos. (Colaborou Marcelo Ribeiro)