Por Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro – Valor Econômico

10/10/2018 – 05:00

Após a maior taxa de renovação em 24 anos, a Câmara dos Deputados retomou as atividades ontem, mas encerrou a sessão sem votar absolutamente nada e a expectativa do governo é de que propostas polêmicas só sejam votadas após o segundo turno da eleição, dia 28 de outubro. O quórum baixo comprometerá a tramitação projetos prioritários para o governo e derrubou ontem já uma medida provisória (MP) com impacto fiscal de R$ 740 milhões em 2019.

A proposta, que perderá a validade hoje por falta de votação, acabava com os incentivos tributários para indústria petroquímica e foi adotada para compensar a desoneração do óleo diesel – a estimativa era economizar R$ 172 milhões este ano. Outros projetos relevantes, como a privatização das distribuidoras da Eletrobras, em discussão no Senado, também devem ficar comprometidos até novembro.

Além da MP da indústria petroquímica, o governo tem outras cinco com maior relevância que podem perder a validade por causa do calendário apertado.

Dessas, três ainda não têm nem parlamentar responsável pela elaboração do parecer indicado. Já a medida que institui uma nova política de incentivos para a indústria automobilística, a Rota 2030, teve o relator, o deputado federal Alfredo Kaefer (PP-PR), derrotado nas urnas. Ele ainda não deu parecer à MP, que perde validade em 16 de novembro.

Por outro lado, o governo pode se livrar assim do impacto fiscal pela pressão para renegociar as dívidas do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). O relator – e vicelíder do governo Temer – reabriu o prazo de adesão ao Refis do Funrural, o que amplia a previsão de perda de arrecadação.

O texto, já aprovado na Câmara, está na pauta do Senado.

Outra MP que corre risco e provavelmente nem será votada é a que modifica o marco legal do saneamento básico, com estímulos à privatização. O texto é polêmico e objeto de oposição das empresas públicas. A MP que cancela o aumento salarial dos servidores públicos federais, uma das bombas fiscais para o atual governo, tem calendário mais longo, até dezembro, mas ainda nem relator tem.

A dois meses do fim, o governo Temer também volta com seus principais articuladores políticos combalidos: os líderes do Senado, Romero Jucá (MDB-RR), e do Congresso, deputado André Moura (PSC-SE), perderam a eleição. Só o líder da Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-GO), retornará em 2019.

Com poucas exceções, os relatores das principais reformas do governo Temer saíram derrotados das urnas. Os únicos que se salvaram foram os deputados Arthur Maia (DEM-BA), que negociou as mudanças na Previdência, e Laércio Oliveira (PP-SE), responsável pelo projeto que liberou a terceirização de mão de obra para todas as atividades. Já os articuladores do teto de gastos, das reformas trabalhista e tributária, da privatização da Eletrobras e do distrato imobiliário ficarão sem mandato.

Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma trabalhista na Câmara e principal responsável por ampliar a flexibilização da CLT, foi a aposta de dúzias de empresários, que se articularam com mais de R$ 1 milhão em doações para que ele tivesse um novo mandato, mas acabou como segundo suplente.

O relator da reforma trabalhista no Senado, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), foi outro que não conseguiu renovar o mandato.

O tucano também é relator do projeto de lei do distrato imobiliário, que aumentaria as multas para os compradores que adquirem um imóvel na planta e desistem antes da conclusão. Ele deu parecer contra a proposta, rejeitada pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Jucá, que tenta negociar a aprovação do PL do distrato em plenário, perdeu o mandato, assim como os dois outros principais interlocutores da construção civil, os deputados Beto Mansur (MDB-SP) e Pauderney Avelino (DEM-AM).

A PEC do teto de gastos, criticada por quase todos os candidatos à Presidência, fez como vítimas seus dois relatores, o deputado Darcísio Perondi (MDB-RS), que recebeu só 38 mil votos – há quatro anos, foram 109 mil-, e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), derrotado por um empresário local que estreou na política nesta eleição.

O relator da reforma tributária, Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), foi abatido junto com o PSDB do Paraná, que não elegeu nenhum parlamentar e viu o ex-governador Beto Richa fazer pífios 3% dos votos para o Senado. A tentativa de privatização da Eletrobras acabou não sendo votada nem na comissão da Câmara, mas derrubou seu relator, o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA). Júlio Lopes (PP-RJ), responsável por projetos como a reformulação da duplicata eletrônica, também não foi reeleito. O relator do projeto que torna automática a adesão ao Cadastro Positivo, deputado Walter Ihoshi (PSDSP), teve a mesma sorte de quatro anos atrás e continuará como suplente.