Por Marta Watanabe – Valor Econômico

Os investimentos das prefeituras das capitais caíram 63,23% de janeiro a agosto contra igual período de 2016. A queda de investimentos no primeiro ano de mandato em relação ao ano de eleições é considerada natural, mas a magnitude mostra que o recuo este ano foi intensificado pela retração da economia, ainda em lenta recuperação, e pelo acesso mais difícil a financiamentos e transferências de capital.

Em igual período de 2013, também primeiro ano de mandato dos prefeitos eleitos em 2012, os investimentos das capitais caíram, mas a uma taxa menor, de 28,6%.

Os relatórios revelam que o ajuste em um ano com receitas apertadas e necessidade de contenção de gastos foi baseado principalmente nos investimentos. De janeiro a agosto, a receita corrente agregada das capitais cresceu 3,04%. As despesas correntes aumentaram mais, em 3,57%. As despesas de pessoal exerceram uma pressão maior. No Executivo, esses gastos subiram 5,88% nos 12 meses encerrados em agosto.

Os dados foram extraídos pelo Valor de relatórios fiscais enviados por 26 capitais ao Tesouro Nacional. Foram consideradas receitas correntes primárias e despesas correntes liquidadas informadas nos relatórios de execução orçamentária. Os dados de despesa de pessoal foram tirados do relatório de gestão fiscal.

Sol Garson, professora do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-secretária de Fazenda do município do Rio de Janeiro, diz que o investimento é sempre a variável de ajuste quando é preciso equilibrar receitas e despesas. As prefeituras, diz ela, ainda enfrentam a crise no setor de serviços, o que derruba a arrecadação própria, ao mesmo tempo em que as transferências dos Estados, via ICMS, ainda não se recuperaram.

Em meio a um processo de forte ajuste, a União, destaca Sol, não tem recursos para as transferências de capital que são importantes para sustentação de investimentos das prefeituras. “Esse gasto, portanto, depende agora da poupança própria, que não existe, porque as receitas ainda não reagiram e as despesas sobem. As prefeituras estão vivendo uma situação difícil e a inflação baixa agrava ainda mais a situação”, afirma.

Muitas despesas, como salários, exemplifica ela, foram reajustadas pela inflação do ano passado e a arrecadação deste ano é sobre preços que variam com inflação bem mais baixa. A variação do IPCA no ano passado foi de 6,29%.

Caio Megale, secretário de Fazenda de São Paulo, diz que despesas obrigatórias correntes reajustadas pela inflação, como convênios nas áreas de saúde, educação e assistência social, tendem a pressionar mais os gastos. Segundo ele, a soma de R$ 1 bilhão em receitas extraordinárias que a prefeitura deve arrecadar este ano por conta de um parcelamento de tributos garantirá ao município fechar 2017 com superávit financeiro.

Com as receitas apertadas, um dos indicadores que têm se deteriorado é o dos gastos com pessoal. Os relatórios das 26 capitais mostram que em 15 delas houve avanço na fatia da despesa bruta de pessoal do Executivo em relação à receita corrente líquida nos últimos 12 meses encerrados em agosto, na comparação com os 12 meses anteriores.

Das 26 capitais, 12 romperam algum dos limites para os gastos com folha estabelecidos pela normas fiscais para o Poder Executivo até agosto. Em cinco capitais – Belém, Teresina, Recife, Curitiba, Porto Velho e Porto Alegre – as despesas de pessoal ultrapassaram o limite de alerta de 48,6% da receita corrente líquida. Em outras cinco – Campo Grande, Cuiabá, Macapá, São Luís e Rio de Janeiro – foi superado o limite prudencial, de 51,3%. E duas, Natal e Florianópolis, romperam o teto de 54%.

O descompasso entre a evolução das receitas e a dos gastos com folha levaram ao avanço do índice fiscal de despesa de pessoal do município do Rio, explica a secretária de Fazenda da capital fluminense, Maria Eduarda Gouvêa Berto. As despesas de pessoal do Executivo avançaram em apenas um ano 7,88 pontos, de 45,53% para 53,41% da receita corrente líquida na comparação de 12 meses encerrados em agosto. Com o novo índice, o Rio se aproxima do teto de 54% para o teto de gastos com folha definido pelas normais fiscais.

Como a receita diminuiu, houve redução do denominador nesse indicador, diz a secretária. Ao mesmo tempo, o numerador, dado pela despesa de pessoal, avançou. As receitas extraordinárias resultantes de venda de folha e de parcelamentos oferecidos pelo município, porém, diz ela, ainda não captadas pelos relatórios finalizados em agosto, devem melhorar os indicadores até o fim do ano.

A queda de receitas, diz Maria Eduarda, pode ser explicada em parte pela alta base de comparação do ano passado e pelo nível de atividade. Em 2016, exemplifica, o município resgatou depósitos judiciais, receita extraordinária que não se repetiu este ano. Além disso, a arrecadação do Imposto sobre Serviços caiu como reflexo da atividade econômica. “Essa arrecadação é muito sensível ao emprego e o município do Rio de Janeiro perdeu 45 mil postos de trabalho de janeiro a julho.”

Também houve redução de ingressos de operações de crédito, lembra a secretária, que caíram de R$ 605 milhões no ano passado para R$ 335 milhões neste ano. As entradas de recursos de financiamentos no ano passado foram naturalmente maiores em 2016 por conta da Olimpíada.

Com receitas menores em caixa, as receitas patrimoniais, resultantes dos investimentos financeiros do município, diz Maria Eduarda, também caíram, com redução de 44% ao fim do segundo quadrimestre contra igual período de 2016. Os investimentos na capital fluminense, seguindo igual tendência, despencaram de R$ 2,6 bilhões para R$ 198,8 milhões, com recuo de 92,36%.

Até o fim do ano, diz a secretária, receitas extraordinárias devem ajudar a melhorar alguns indicadores do Rio. Ela cita R$ 223 milhões arrecadados com a venda de folha de pagamentos em setembro – que não foram captados pelos relatórios de agosto – e outros R$ 500 milhões que devem ser recolhidos até fim de 2017 em um programa de parcelamento.

Segundo os relatórios, as receitas primárias correntes da capital fluminense caíram 4,1% nominais de janeiro a agosto na comparação com iguais meses de 2016. No mesmo período as despesas correntes recuaram 1,82%, mas as de pessoal avançaram 7,7%, mostrando que o ajuste à queda das receitas se deu basicamente nas despesas de custeio.

No início do ano, lembra Maria Eduarda, um decreto determinou corte de 25% nos contratos vigentes, o que permitiu parte do ajuste. O crescimento dos gastos com pessoal, porém, diz ela, acabou sendo determinado já no fim do ano passado, com o reajuste aos servidores pela inflação de 2016.

Para o ano que vem, afirma a secretária, as perspectivas são melhores. Além de operações de créditos e projetos de investimento já encaminhados, há expectativa de melhora da arrecadação com o avanço do PIB – de 0,5% este ano para alta de 2,5% em 2018. A melhora de cenário deve repercutir, diz Maria Eduarda, especialmente na arrecadação do ISS enquanto o IPTU, cobrado sobre a propriedade de imóveis, deve render R$ 300 milhões adicionais em 2018 por conta de atualização na planta de valores. Outros R$ 300 milhões extras devem vir da elevação de alíquotas do ITBI, imposto cobrado sobre a comercialização de imóveis.