Por Fábio Pupo – Valor Econômico

17/05/2019 – 05:00

A União encerrou o primeiro trimestre registrando o menor patamar de investimentos em pelo menos 13 anos. O valor de R$ 6,2 bilhões de janeiro a março corresponde a 0,35% do Produto Interno Bruto (PIB), percentual mais baixo para o período em toda a série histórica (com início em 2007). A queda é resultado da contenção de despesas do governo em meio à dificuldade de cumprir a meta fiscal do ano. O contingenciamento de recursos deve agravar o cenário.

Os números foram calculados pelo Valor com base nos mais recentes dados de investimento divulgados pelo Tesouro Nacional e pelos dados preliminares do PIB do Banco Central (BC). O indicador mostra a magnitude do corte de despesas promovido pelo Executivo federal nos últimos anos e, mais intensamente, nos últimos meses.

O percentual representa menos de um quarto do registrado no primeiro trimestre de 2014, ápice da série histórica para o período – o valor era de R$ 27,4 bilhões (considerando números atualizados), ou 1,48% do PIB daquele período.

Na definição do Tesouro, os investimentos são despesas que contribuem para a produção ou geração de bens que integrarão o patrimônio público. Entre os exemplos, estão obras, instalações, compras de máquinas e equipamentos e outros itens. O valor de R$ 6,2 bilhões aplicado no ano é 30% menor que em igual período de 2018. Enquanto isso, as despesas correntes de custeio – aquelas ligadas ao funcionamento cotidiano da máquina pública (como água, luz e despesas com diárias) – caíram 7%, para R$ 43,7 bilhões.

O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, afirma que a queda nos investimentos decorre da dificuldade do governo de cumprir a meta para o resultado primário do ano. “Estamos indo de fato para um nível muito baixo de investimento público. Entre outras coisas porque neste ano tivemos que fazer um contingenciamento muito grande para cumprir a meta de primário”, disse na mais recente entrevista à imprensa sobre os números do mês.

Segundo ele, a principal dificuldade está na arrecadação – que continua menor que o previsto, principalmente diante do ritmo de recuperação da atividade. “A despesa que mais tem sido sacrificada é o investimento público, que já é muito baixo dado o tamanho da carga tributária. Já está chegando num nível muito crítico.” Para ele, o que modificaria essa realidade é alterar as obrigatórias – que têm como componente principal a Previdência. Ele vê o investimento terminar o ano em patamar inferior a 0,5% do PIB, o que seria o nível mais baixo para o ano fechado em toda a série histórica (o mais pertodisso foi 2017, com 0,7%).

O economista Manoel Pires, ex-secretário no Ministério da Fazenda, afirma que o corte em investimentos contribui para o arrefecimento da economia. “Claramente não ajuda o cenário de atividade. Soma-se a isso o que acontece nos Estados, que também estão retraindo bastante as despesas”, disse. Ele lembra que o contingenciamento da União foi anunciado ao fim do primeiro trimestre – por isso, o bloqueio de recursos está pouco capturado nos números. Isso tende a agravar o cenário.

Além disso, uma nova contenção orçamentária será anunciada neste mês.

Pires sugere duas saídas para a situação enquanto não é aprovada a reforma da Previdência, considerada a solução estrutural para o problema fiscal. A primeira seria um ganho com receitas extraordinárias. Ou, se não houver alternativa, revisar a meta de resultado primário do ano. “Sempre encarei essa questão da [revisão da] meta como um encontro com a realidade. Independentemente do viés da equipe econômica, vejo essa questão como algo pragmático.”

A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão do Senado voltado à análise das contas públicas, afirma que o Estado está perdendo capacidade de promover investimentos diante do avanço das outras despesas. Para a entidade, o ajuste fiscal continuará penalizando investimentos caso a trajetória das despesas obrigatórias não seja revista.

“A rigidez orçamentária tem aumentado, dado o avanço quase automático das despesas obrigatórias, o que deixa margem pequena para a evolução das discricionárias – que contêm, por exemplo, os investimentos públicos federais”, afirma relatório da equipe de Felipe Salto, diretor-executivo da IFI. “Será difícil para o Estado retomar a capacidade de ampliar despesas de capital enquanto a dinâmica do gasto obrigatório continuar a exercer pressão”, afirma o documento.