Luiz Guilherme Gerbelli, especial para o Estado, O Estado de S.Paulo

20 Dezembro 2017 | 05h00

Com o BNDES menos agressivo, mercado de capitais e instituições multilaterais devem preencher lacuna

O financiamento de obras de infraestrutura passa por um rearranjo entre os seus atores. Com a sinalização de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) deve ser menos agressivo do que foi no passado, novas fontes de financiamentos terão de ser encontradas.

Por ora, a expectativa é que a lacuna deixada pelo banco de fomento seja absorvida pelo mercado de capitais e pelas instituições multilaterais que oferecem financiamento para obras em países da América Latina. “Em vez de se ter um único e óbvio financiador de longo prazo, os empreendedores terão de buscar alternativas”, afirma o chefe da área de project finance do Itaú BBA, Marcelo Girao. “Não é possível desligar a chave do BNDES, mas cada vez mais outras fontes de financiamentos devem surgir. Um mercado de capital local mais ativo já é uma realidade.”

Até o início da crise econômica que assolou o Brasil nos últimos anos, o BNDES aparecia como o grande financiador de obras de infraestrutura. No auge, nos 10 primeiros meses de 2014, o banco de fomento desembolsou R$ 52,6 bilhões. Neste ano, os desembolsos somaram apenas R$ 19,6 bilhões para o mesmo período (ver gráfico).

Além de volumosos, os empréstimos do BNDES sempre foram oferecidos em condições melhores que as do mercado. Uma situação que também deve mudar. O governo Michel Temer aprovou a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP) para substituir a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) nos financiamentos do BNDES. A TLP deve convergir para um valor mais próximo do oferecido pelo mercado.

“O BNDES não diminuiu (os desembolsos) porque decidiu diminuir. O mercado é que demandou menos recursos. As empresas demandaram menos ou por causa da crise econômica ou porque foram afetadas pela Operação Lava Jato”, diz a diretora da área de Infraestrutura do BNDES, Marilene Ramos.

Embora os desembolsos estejam com ligeira queda neste ano na comparação com 2016, Marilene projeta um crescimento até o fim de 2017, ainda que pequeno. Para os próximos anos, o BNDES estima um cardápio de R$ 27,2 bilhões para projetos de geração e transmissão de energia e de R$ 30 bilhões em logística. Mobilidade urbana e saneamento. “A participação do BNDES continuará sendo preponderante.”

Nos últimos anos, o investimento no setor de infraestrutura ficou bem abaixo do que o Brasil necessitava. Agora, com a recuperação da economia, ainda que tímida, a expectativa é que os investidores, sobretudo os internacionais, consigam recuperar toda a demanda reprimida.

Os últimos leilões do governo já sinalizaram que os investidores internacionais têm apetite pelos projetos do Brasil. Em setembro, por exemplo, o leilão das usinas da Cemig, teve vitórias de grupos chinês, francês e italiano.

“Os investidores locais ainda estão fragilizados. Apesar da queda nos investimentos em infraestrutura, o que tivemos até agora foi bancado pelos investidores estrangeiros”, afirma o responsável pela área de Project Finance do banco Santander, Edson Ogawa.

Garantias. Para o diretor presidente da BF Capital, Renato Sucupira, o Brasil ainda precisa consolidar um instrumento de garantia para os projetos de infraestrutura dos aspectos que não são aceitos pelo setor privado. Durante participação no Fórum Estadão Infraestrutura: Investimentos e Geração de Empregos, o executivo lembrou que no caso de alguns projetos no setor elétrico, bem avaliados, conseguiu atrair investidores estrangeiros que trouxeram suas garantias e, ainda, suas estruturas de financiamento.

Alberto Zoffmann, responsável pela área de Projetos de Financiamento da XP Investimentos, disse que há muita exigência de garantias no Brasil porque os riscos são elevados. Apesar disso, ele disse que no País já há alguns exemplos de projetos sem a garantia dos financiamentos, mas que ainda são pequenos. Para ele, essa questão precisa de um planejamento do projeto.

O presidente do banco Fator, Gabriel Galípolo, disse que hoje o setor elétrico é praticamente o único que consegue atrair capital.

3 PERGUNTAS PARA…

Gabriel Galípolo, presidente do banco Fator

  1. Como o sr. avalia os interesses dos investidores pelos projetos que devem despontar?

Hoje, eu vejo três tipos de players: construtoras que viraram investidores; fundos que estão comprando ativos interessantes; e os investidores estratégicos internacionais, como é o caso dos chineses.

  1. Como esses novos players no mercado?

Existem projetos interessantes que estão à venda por causa do que aconteceu com antigos acionistas (crise econômica e as empresas que foram afetadas pela Lava Jato). Há uma preferência por concessões e projeto de PPPs já ‘performados’.

  1. Com a eleição, 2018 deve ser marcado por incertezas. Como o sr. avalia o cenário para os projetos de infraestrutura?

Ao longo do ano, vamos ver projetos pensados em privatizações. Estados e União devem focar nisso. Na instabilidade (com a eleição) de 2018, devem aparecer fundos internacionais estratégicos. É na instabilidade que esses fundos compram (ativos) por preço mais barato.