Por Sergio Lamucci – Valor Econômico

A inflação baixa esperada para este ano, possivelmente inferior a 3%, deixará um legado muito benigno para os índices de preços ao consumidor do ano que vem. A forte inércia, que por vários anos propagou a inflação alta do passado para o futuro, vai contribuir para moderar a variação dos indicadores em 2018. Nesse cenário, é grande a possibilidade de um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) abaixo de 4% no ano que vem, mesmo com a perspectiva de um crescimento mais forte da economia e de uma recuperação dos preços de alimentos, após a deflação deste ano.

O economista-chefe da Santander Asset Management, Ricardo Denadai, diz ter uma visão “muito favorável para a trajetória da inflação”, projetando um IPCA de 2,9% em 2017 e de 3,8% em 2018. “A inércia, que jogava contra, agora vai jogar a favor”, afirma ele, que espera uma inflação de serviços em 2018 de 3,8%, inferior aos 4,7% projetados para este ano.

Um dos motivos é justamente o fato de que a inflação deste ano ficará muito baixa. Denadai acredita numa alta modesta, na casa de 2%, para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), usado para corrigir o salário mínimo. Indicador que mede o custo de vida de quem ganha até cinco salários mínimos, o INPC acumula alta de apenas 1,73% nos 12 meses até agosto, inferior aos já baixos 2,46% do IPCA, devido ao peso maior dos alimentos. A cesta de consumo do IPCA vai até 40 salários mínimos.

No IPCA, o reajuste do salário mínimo impacta diretamente os itens empregado doméstico e mão de obra para reparo. Além disso, influencia o reajuste de diversos serviços pessoais, como cabeleireiro, manicure e despachante. “O aumento do salário mínimo é uma referência muito relevante”, resume Denadai.

Nesse quadro, ele projeta uma inflação para o subgrupo de serviços pessoais de 3,4% no ano que vem, inferior à de 5,4% projetada para este ano. O economista Fabio Ramos, do UBS Brasil, também ressalta que o INPC mais baixo vai segurar o aumento do mínimo. “E inflação passada menor ajuda a ter uma inflação futura menor”, reforça ele, citando também os menores repasses em itens como educação, condomínio, aluguéis, contratos em geral e salários. Ramos projeta um IPCA de 2,9% em 2017 e de 3,7% em 2018, um número confortavelmente abaixo da meta perseguida pelo Banco Central (BC), de 4,5%.

Para ele, o grupo de serviços deve ter uma inflação ligeiramente acima da que deve ser registrada neste ano, avançando de 4,4% para 4,7%. Ainda assim, será uma variação baixa para o grupo, considerando que, entre 2010 e 2016, esses preços subiram a uma média anual de 8,2%. Ramos diz esperar uma inflação de serviços um pouco maior em 2018 porque a inflação “cheia” não será tão baixa como em 2017 e o nível de ociosidade na economia será menor. Denadai, como já dito, vê os preços de serviços crescendo apenas 3,8% no ano que vem, influenciados pelo efeito da inflação mais baixa deste ano.

Nas projeções do economista, o comportamento mais favorável esperado para os preços de serviços ajuda a aliviar a reversão de tendência dos preços de alimentos esperada para 2018. Denadai espera que o grupo alimentação no domicílio caia 2,3% neste ano e suba 6% no ano que vem. Essa projeção, porém, tem viés de baixa, diz ele. Se houver uma redução na estimativa para esse item, a projeção para o IPCA “cheio” de 2018, atualmente em 3,8%, pode ser revista para baixo.

Ramos, por sua vez, acredita que alimentação no domicílio cairá mais neste ano. Ele projeta um recuo de 4,3% para o grupo em 2017, apostando num avanço menos intenso no ano que vem – para o qual vê uma alta de 2,8%.

Denadai diz ainda que a inflação baixa vai ajudar a segurar os índices de preços pelo seu efeito sobre os salários superiores ao do mínimo. Segundo ele, “a dinâmica da inflação passada ganhou relevância para a dinâmica dos salários” na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Nesse cenário, Denadai acredita que os salários vão seguir em desaceleração nos próximos meses em termos nominais (quando não se desconta a inflação) nos próximos trimestres, também por considerar que a melhora do trabalho será gradual. Os reajustes salariais vão olhar para uma inflação inferior a 3%, ou de cerca de 2% no caso do INPC. No começo do ano, os rendimentos da Pnad cresciam cerca de 8% em termos nominais em relação ao mesmo período do ano anterior. Em agosto, o ritmo tinha caído para 4,7%.

“Em outras palavras, mesmo se o mercado de trabalho melhorar, acreditamos que salários continuarão desacelerando por mais algum tempo, aliviando custos e a inflação de modo geral”, diz ele, reiterando que o fato de o salário mínimo ser reajustado por algo na casa de 2% “também vai ajudar nesse processo, contribuindo para ancorar os aumentos de outros salários.

Com a perspectiva de que a inflação baixa deste ano reforçará as projeções de um IPCA abaixo de 4% no ano que vem, o Banco Central (BC) tem tranquilidade para continuar a cortar os juros. A aposta dominante hoje é de que a Selic, atualmente em 8,25% ao ano, poderá fechar 2017 em 7%, havendo a possibilidade de reduções adicionais em 2018. Nesse quadro, um eventual aumento da taxa ocorreria apenas em 2019.