Por Rafael Bitencourt, Daniel Rittner e Raphael Di Cunto – Valor Econômico

13/04/2018 – 05:00

O governo ainda não alinhou posição com a Câmara dos Deputados sobre a publicação do decreto que inclui a Eletrobras no Programa Nacional de Desestatização (PND). O ministro de Minas e Energia, Moreira Franco, havia prometido publicar a decisão ontem no “Diário Oficial da União”, o que não ocorreu.

Declarações dadas ontem pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), indicaram que o decreto poderia não ter saído por novos desentendimentos do parlamentar com o governo. Maia manifestou descontentamento com o anúncio da publicação. Disse que o anúncio não aconteceu porque o Planalto assegurou que não usaria o instrumento para dar andamento à privatização da Eletrobras. “O Palácio disse que não haverá decreto”, afirmou Maia ao Valor.

Moreira Franco afirmou que a publicação não saiu por questões burocráticas. Ele teria assinado o decreto, na tarde quartafeira, dia da solenidade de transmissão de cargo de ministro. Segundo ele, o texto havia sido protocolado pela pasta no Sidof, o sistema informatizado para tramitação de documentos do governo, e depende agora de análise da Subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil.

Fontes no Palácio do Planalto afirmaram que não há previsão para concluir a análise. O certo, segundo um auxiliar direto de Michel Temer, é que o ato não sairia hoje novamente no “Diário Oficial da União” e que dependeria da assinatura de Temer.

Moreira se recusou, no entanto, a comentar declarações do presidente da Câmara de que o decreto não sairá. “Não vou ficar alimentando conflito”, limitou-se a dizer.

No Planalto, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, ponderou que houve “confusão” em relação ao decreto, que visa dar continuidade aos estudos para a capitalização da Eletrobras, e não atropelar os interesses do Congresso que discute o tema.

“Houve uma confusão com esse decreto. Estamos avaliando os termos para que fique claro”, disse Marun, em entrevista após a reunião ministerial no Planalto. “O decreto deve ser publicado”. E enfatizou que os estudos em relação ao tema precisam avançar. O líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), chegou a acionar o Planalto após críticas de parlamentares, entre eles o próprio Maia, sobre o decreto.

O deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), relator da privatização da Eletrobras, disse ontem que o decreto “antecipa” o que está para ser definido no Projeto de Lei 9463/2018. “O decreto antecipa algo que está sendo discutido no Congresso. Se fosse necessário para alguma coisa, mas não é no momento”, afirmou o deputado depois de reunião com o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia.

O deputado Hugo Motta (PRB-PB) tentou ontem minimizar o embate travado entre o governo e o presidente da Câmara. “É muito mais especulação do que conflito de fato, pois não tenho notado isso”, disse o deputado, que é presidente da Comissão Especial criada para discutir a privatização. Para Motta, o presidente da Câmara tem feito o esforço de contribuir com o governo em relação ao plano de privatização da estatal. “O presidente tem procurado ajudar, e ajudou ontem [quarta-feira ] nesse acordo que foi feito. Espero que esse clima de harmonia possa continuar. No final, é claro que quem tiver voto vai vencer”, afirmou o deputado ao sair de reunião com Moreira Franco, na sede do Ministério de Minas e Energia.

Aleluia considera que o atraso no debate do tema na Câmara deve jogar para maio a votação do seu relatório na Comissão Especial. “Acho que o assunto vai deslizar para o início de maio.”

O relator espera que o debate flua a partir de agora, pois foram aprovadas as primeiras audiências públicas com representantes do setor. “Acho que semana que vem já está garantido que vai ter trabalho. Teremos duas audiências, com o presidente da Eletrobras e o conjunto de pessoas indicadas pelos partidos de oposição, do mundo sindical e acadêmico”, afirmou.

Ainda não foi descartada a possibilidade de levar o PL diretamente à votação no plenário da Câmara se não houver evolução no debate na comissão. “Para Isso, é necessário que a maioria da casa, 257 deputados, aprove o requerimento de urgência. Esse não é o desejo, mas é uma possibilidade”, disse.

O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Junior, disse ter sentido “compromisso genuíno” do governo com os esforços para a privatização da estatal. “Minha visão, pelo que ouvi do presidente, do Moreira Franco, do Guardia e do Dyogo foi que devemos manter força e foco total na privatização”, disse em São Paulo.

A contratação do assessor que vai trabalhar na modelagem da operação deve sair nesta quinzena, disse o presidente da estatal. Segundo ele, esse assessor terá a missão de fazer a modelagem da cisão da Eletronuclear e da usina de Itaipu, que não podem ser privatizadas por restrições legais.

“Trabalho com cronograma de terminar esses trabalhos em agosto, até no máximo começo de setembro, para que tenhamos uma assembleia de acionistas em setembro”, disse o executivo. Com isso, será possível fazer a capitalização da companhia depois da divulgação do balanço do terceiro trimestre, em meados de novembro.

Sobre a negociação com a Petrobras para transferir a dívida da Amazonas Distribuidora com a petroleira para a Amazonas Geração e Transmissão, o executivo disse estar “muito otimista”. “Nessa semana avançamos muito”, disse ele, lembrando que o prazo final para a conclusão da desverticalização da Amazonas Energia, fundamental para a privatização da distribuidora, termina 30 de abril.

A capitalização da Eletrobras, que deve resultar na privatização da companhia por meio da diluição da participação da União na companhia, não está limitada aos R$ 12 bilhões previstos pelo governo como pagamento da outorga da descotização da companhia, disse Ferreira Junior. “Nada impediria uma capitalização maior, o que poderia impedir são as condições de mercado”, disse. (Colaboraram Cristiane Bonfanti, de Brasília, e Camila Maia, de São Paulo)