Por Raphael Di Cunto – Valor Econômico

12/11/2018 – 05:00

Empenhado em definir o formato do novo ministério e as primeiras medidas que serão adotadas a partir de 1º de janeiro, o governo de transição vive um vácuo de articulação política no Congresso Nacional e terá que lidar com uma série de propostas que exigirão um esforço fiscal maior no ano que vem, como aumento de salários – inclusive dos próprios parlamentares -, concessão de subsídios e prorrogação de desonerações.

Partido do presidente eleito Jair Bolsonaro, o PSL saiu das urnas como uma das principais forças da próxima legislatura, mas, por enquanto, é apenas nanico, com oito deputados e nenhum senador. O partido não tem estrutura de liderança, com uma equipe técnica no Legislativo capaz de avaliar os projetos, nem força para barrá-los em plenário.

Bolsonaro e o governo de transição sequer têm tentado negociar as propostas no Congresso. A primeira reunião do eleito com os presidentes da Câmara e Senado estava prevista para amanhã, mas foi cancelada. Na semana passada, embora o presidente eleito tenha pregado contra a concessão de subsídios durante a campanha e sua equipe econômica discordasse da medida provisória (MP) do Rota 2030, nova política de incentivos tributários para a indústria automotiva, Câmara e Senado votaram o texto sem contestações.

O Rota 2030 custará R$ 2,1 bilhões em renúncia de receita em 2019. O líder do PSL na Câmara, Eduardo Bolsonaro (SP), deixou de participar da reunião de líderes em que foi definida a votação dessa proposta para almoçar com seu pai e com o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele enviou de última hora para a reunião o deputado Marcelo Álvaro (PSL-MG), que disse não estava acompanhando.

Durante as mais de oito horas de debates em plenário, o PSL só declarou seu voto quando o deputado delegado Waldir (PSL-GO) queria rebater os petistas. “Eu só orientei [o voto] para poder usar o tempo para atacar o PT. Não recebemos nenhuma orientação do Paulo Guedes”, disse Waldir ao Valor. “Somos o braço político, a gente vota contra ou a favor dependendo da orientação da equipe econômica, mas não tivemos reunião para discutir a pauta”, afirmou.

Os senadores aprovaram mudanças no setor elétrico sem qualquer palavra do governo eleito. O texto seguiu para a Câmara. Bolsonaro criticou, pela imprensa, a possibilidade de que o Senado aprovasse o aumento de 16% no salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Procuradoria-Geral da República (PGR), mas não fez nenhuma ligação ou reunião com seus aliados ou o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), para tentar evitar a votação. Nos bastidores já são fortes as conversas para estender o reajuste aos deputados e senadores também.

A Câmara discutirá hoje um projeto que está alinhado ao programa de governo do eleito, de ampliar as privatizações: a MP que muda o marco legal do saneamento básico e estimula que empresas privadas assumam o serviço no lugar de estatais.

Um integrante do governo diz que Bolsonaro mostrou simpatia pela proposta, mas não mexeu um dedo para ajudar a votar a MP – que perde a validade se não for aprovada até amanhã.

Os deputados aprovaram, por unanimidade, regime de urgência para o projeto que inclui novas categorias profissionais dentro do Simples, o que aumentará a renúncia de receita desse regime tributário, e tentam votar, direto em plenário, a prorrogação de uma desoneração de mais de R$ 6 bilhões no Imposto de Renda (IR) para as empresas que investirem nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Outro projeto importante para as contas públicas é a venda da cessão onerosa dos campos de pré-sal. O governo Temer pretendia fazer o leilão ainda este ano, para que os recursos entrassem nos cofres da União já no ano que vem, mas até agora não há nenhuma articulação do eleito para que o texto avance no Senado. O projeto que muda a tributação dos fundos de investimentos exclusivos, e renderia R$ 10 bilhões no próximo ano, é outro parado nas gavetas do Congresso.

Enfraquecido, o governo Temer já tirou o pé das articulações políticas e têm esperado que o governo eleito assuma as conversas pela aprovação de projetos. O líder do Executivo na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), mal tem participado das sessões de plenário. A comissão que analisa a MP que cancela o reajuste dos servidores públicos mal conseguiu iniciar a eleição de seu presidente e já foi adiada.