Por Fernando Torres – Valor Econômico

Um estudo que será divulgado hoje pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) confirma, com bases técnicas, aquilo que a “sabedoria popular” dava como certo: as estatais com ações listadas na bolsa brasileira B3 têm práticas de governança corporativas piores que a média das demais empresas do mercado.

As sociedades de economia mista apresentam indicadores ruins em diversos aspectos, como distribuição entre os segmentos de governança, percentual de membros independentes no conselho, frequência de uso de comitês de assessoramento e na adoção de políticas de gerenciamento de riscos.

A boa notícia é que a lei das estatais, que deve ser totalmente observada a partir de 1º de julho de 2018, tende a melhorar sensivelmente algumas métricas em que elas aparecem “mal na foto”.

A má notícia é que esse instrumento legal, na visão do IBGC, não corrige dois dos principais problemas de governança que contribuíram para provocar perdas para essas empresas nos últimos anos: a indicação de caráter políticopartidária de conselheiros e diretores e o desvio das atividades da empresa para atender objetivos diversos daqueles para os quais ela foi criada.

O trabalho foi feito pelo IBGC e se baseou em dados de 30 sociedades de economia mista com ações listadas na B3, que representam 7% do total de companhias, mas 18% do valor de mercado. Do total, oito são federais, 21 estaduais e uma municipal. Em termos de setores, os de energia (43%), financeiro (33%) e saneamento (13%) são os mais representativos.

O estudo mostra que apenas 17% das estatais estão no Nível 2 ou no Novo Mercado- os dois segmentos com mais exigência de práticas de governança -, enquanto no conjunto das empresas da bolsa esse índice alcança 34%. O estudo aponta que cinco delas se listaram neste século e optaram pelo segmento “tradicional” – em que a empresa precisa observar apenas as exigências legais.

Uma característica que se observa na pesquisa, e que é incompatível com a nova lei das estatais, é que para 33% das empresas há previsão estatutária de que um ocupante da administração pública (como ministros ou secretários) sejam obrigatoriamente membros dos conselhos. E em 20% delas o estatuto também atribui ao acionista controlador a função formal de nomear diretores – papel que, conforme a Lei das S.A., cabe ao conselho de administração.

A lei das estatais impede a indicação de ministros, secretários de Estado e dirigentes de partidos políticos para cargos. Mas para o IBGC isso não resolve a questão. “Nada impede que a pessoa, que tecnicamente passe pelos requisitos, esteja vinculada aos interesses do ente politico que indicou”, diz Danilo Gregório, gerente de vocalização e influência do IBGC.

Entre os 271 conselheiros de administração titulares identificados na pesquisa, apenas 11% são considerados “independentes”. E, conforme o estudo, esse índice é puxado para cima pelas estatais do Nível 2 e Novo Mercado – segmentos em que ao menos 20% dos membros precisam atender essa condição. Excluindo esse subgrupo de empresas, há apenas dois conselheiros independentes em uma amostra de 158 indivíduos. Essa é uma das características que devem mudar com a nova lei, dado que ela prevê que ao menos 25% dos membros sejam independentes.

Uma preocupação que vem sendo demonstrada inclusive por membros do setor público, segundo Heloisa Bedicks, superintendente do IBGC, é com a previsão legal de que os conselhos tenham de 7 a 11 membros. “Em algumas empresas sete pessoas é muito. Pode haver inchaço desnecessário nesses conselhos”.

A regra, na verdade, vai sancionar um desvio que já ocorre. As estatais pesquisadas tem em média de 8,7 conselheiros, enquanto as privadas nacionais trabalham com 6,4 pessoas e as estrangeiras, com 6,9.

Em termos de gestão de risco, a pesquisa do IBGC apontou que pouco mais de um terço das estatais possuem uma política formal para tratar desse tema e, embora 76% possuem códigos de conduta, só 27% contam com políticas de prevenção a corrupção.