Por Fabio Graner – Valor Econômico

Ana Paula Vescovi: “Teremos o mesmo filtro para todos; isso vai avançar muito na
análise das contas públicas”

A partir do ano que vem Estados, Distrito Federal e capitais serão obrigados a fornecer ao Tesouro Nacional informações primárias de suas contabilidades para a elaboração dos relatórios fiscais. A secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, disse ao Valor que a chamada Matriz de Saldos Contábeis permitirá à sociedade analisar os dados fiscais regionais seguindo um critério único, conforme as normas do órgão central e o padrão internacional, avançando nas discussões sobre a gestão pública.

“O grande ganho que a sociedade vai ter é poder olhar a partir de uma lente única para analisar todos os entes”, disse Ana Paula. Ela explicou que a obrigatoriedade colocada pelo Tesouro foi definida com base em uma prerrogativa dada na lei complementar que renegociou a dívida dos Estados com a União. “A gente vai endereçar a harmonização. Teremos o mesmo filtro para todos. Isso vai avançar muito na análise das contas públicas, na avaliação de políticas e na capacidade de formulação dos gestores”, acrescentou.

Portaria recentemente publicada pelo Tesouro estabelece a obrigatoriedade de fornecimento de dados primários e define que o ente que não cumprir a determinação de fornecer os dados contábeis primários estará impedido de receber transferências voluntárias da União e contratar novas operações de crédito, exceto as que envolvem refinanciamento de principal da dívida. Por outro lado, a efetivação do sistema deve dar mais celeridade para o Tesouro analisar os pleitos e autorizar a liberação de recursos e tomada de empréstimos.

Outro efeito esperado da iniciativa é a maior clareza sobre a situação dos Estados e Municípios em termos de gastos com pessoal e previdência, temas que envolvem divergências de interpretação entre alguns Estados e o Tesouro. Muitas vezes, com respaldo dos Tribunais de Contas Estaduais e Municipais, alguns Entes subestimam seus gastos nessas rubricas, colocando alguns itens em grupos de despesas diferentes. Por exemplo, inativos são retirados do gasto com pessoal para efeito de cumprimento de limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Com a Matriz de Saldos Contábeis, os dados originais de cada subgrupo de receita e despesa serão enviados mensalmente ao sistema desenvolvido pelo Tesouro. Este programa formatará essa informação primária com base nos critérios da Fazenda federal e emitirá os rascunhos dos relatórios, que já serão públicos, conforme explicou ao Valor a subsecretária do Tesouro e contadora-geral da União, Gildenora Dantas Milhomem.

Segundo ela, caso os Estados queiram ajustar alguma formatação de dados constantes dos relatórios feitos com base na matriz a partir de um entendimento diferente sobre contabilização de algum item, deverão fazê-lo na forma de nota explicativa. Os gestores locais continuarão tendo que declarar para o Tesouro que estão cumprindo as obrigações da LRF.

A subsecretária informou que o Tesouro está preparando uma espécie de “convênio guarda-chuva” para que os Tribunais de Contas Estaduais possam aderir e ter acesso facilitado à Matriz e aos relatórios produzidos, acelerando a análise das finanças regionais. O convênio geral fica aberto e aquele que quiser participar dessa troca de informações por meio de um termo de adesão. “Como há procura grande por parte de quase todos os tribunais, nós decidimos fazer um acordo de cooperação maior”, disse, explicando que o instrumento legal está em fase final para publicação.

Muitos Tribunais de Contas analisam não só contas dos Estados, mas também de uma série de municípios, trabalho que muitas vezes é dificultado pelas diferentes formatações que cada ente dá para os dados apresentados à respectiva corte de contas.

Além dos Estados, DF e capitais já serem obrigados a fornecer a partir de janeiro do ano que vem, os municípios que têm regime próprio de Previdência terão que fazê-lo a partir de julho de 2018. O restante das cidades terá um prazo mais longo e serão obrigados apenas a partir de 2019. A exigência não incluirá dados antigos das contas estaduais e municipais.

Ana Paula explicou que a obrigatoriedade de fornecimento dos dados primários não interfere na autonomia dos entes da federação. Ela lembrou que Estados e Municípios poderão continuar apresentando seus relatórios e análise conforme entendimento dos Tribunais locais, para efeito de cumprimento das regras fiscais, mas agora haverá maior transparência dos dados e facilitação do controle social.

“Isto vai ensejar um amadurecimento da sociedade na questão fiscal. E isto está se tornando possível por uma questão tecnológica, uma inovação”, disse, destacando que o sistema foi desenvolvido pelo Tesouro e é facilmente integrável com os existentes em Estados e Municípios.

A secretária do Tesouro também ressaltou que o órgão estará atento a eventuais dificuldades operacionais que venham a surgir para ajudar os entes a cumprirem suas obrigações.