Por Mateus Rodrigues, G1 DF

22/09/2017 05h00

Ministério de Minas e Energia analisa extinção do horário com base em ‘queda de efetividade’. De 2013 para 2016, economia gerada caiu de R$ 405 milhões para R$ 159 milhões; ‘pouco é melhor que nada’, diz especialista.

A economia gerada ao governo federal com a aplicação do horário de verão caiu 60,6% nos últimos quatro anos. Entre 2013 e 2016, o montante passou de R$ 405 milhões para R$ 159,5 milhões – no último ano, o horário ocorreu entre 16 de outubro de 2016 e 18 de fevereiro de 2017. Mesmo assim, especialistas defendem que “pouco é melhor que nada” e que a manutenção da medida também ajuda a evitar apagões.

A ideia de extinguir o horário de verão no Brasil – em estudo há pelo menos seis meses no Ministério de Minas e Energia – deve ser analisada nas próximas semanas pelo presidente Michel Temer, com base em notas técnicas que apontam “perda de efetividade” na mudança de horário.

No entanto, relatórios do ministério divulgados nos últimos anos, apontam um cenário diferente. A redução da economia, apontada pelo governo, reflete um aumento no consumo de energia – o que, desde 2015, vem sendo evitado por meio do horário de verão.

Naquele ano, o Ministério de Minas e Energia divulgou que a adoção da medida economizaria cerca de R$ 7 bilhões aos cofres públicos. Isso porque, caso não fosse aplicada, o governo teria de investir o montante na expansão da capacidade elétrica do país, como impulsionar o funcionamento das usinas térmicas – tipo mais caro de geração de energia.

O G1 entrou em contato com o Ministério de Minas e Energia nesta quarta-feira (20), em busca de entrevista e dos relatórios emitidos nos últimos anos. Até a noite de quinta (21), a pasta tinha enviado apenas a ata da última reunião do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), que aponta a necessidade de “aprofundar os estudos” sobre a manutenção do horário de verão.

Também procurados, o Operador Nacional do Setor Elétrico (ONS) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) afirmaram que as informações serão prestadas apenas pelo ministério. A Casa Civil confirmou que “está avaliando a conveniência ou não do tema horário de verão”, mas também disse que o tema está com o ministério.

Economia acumulada

De acordo com os dados divulgados pelo Ministério de Minas e Energia nos últimos anos, o Brasil economizou pelo menos R$ 1,4 bilhão desde 2010 por adotar o horário de verão. A metodologia do cálculo variou ao longo desse tempo, e o G1 aguardava os dados atualizados do ministério até a publicação desta reportagem.

Entre 2010 e 2014, o aproveitamento da luz do sol resultou em economia de R$ 835 milhões para os consumidores – média de R$ 208 milhões por “temporada”. Em 2013, o alívio aos cofres da União foi da ordem de R$ 405 milhões. Entre 2014 e 2015, a previsão era de poupar mais R$ 278 milhões – o resultado final, em reais, não foi divulgado pela pasta.

Entre 2015 e 2016, a economia foi de R$ 162 milhões, e no período seguinte, caiu para R$ 159,5 milhões. Por esses dados, de fato, é possível notar uma queda na economia. No entanto, especialistas ouvidos pelo G1 indicam que esses números também foram influenciados pela crise econômica.

“Desde 2015, de fato, houve uma queda [de consumo e de economia] por causa da crise. Mas se o país voltar a crescer, o consumo também volta. A gente está muito longe ainda de convergir o consumo, de estabilizar essa curva. O país tem um consumo individual de eletricidade muito baixo”, afirma o presidente da consultoria Thymos, João Carlos Mello.

Durante todo esse tempo, as estimativas de economia em termos percentuais se mantiveram praticamente estáveis. A cada temporada, o horário de verão representa economia média de 0,5% no consumo de energia, chegando a 5% nos horários de pico. Essa energia poupada é suficiente para abastecer uma cidade como Brasília, com 2,8 milhões de habitantes, por até um mês.

Horário de pico?

Segundo João Carlos Mello, mais que a economia “direta” (em energia poupada), o alívio nos horários de pico é importante para dar segurança ao sistema elétrico nacional. Durante o verão, o nível dos reservatórios cai e a demanda por energia aumenta, puxada pelo uso de chuveiro e ar-condicionado.

Nos relatórios entregues à Presidência da República, os técnicos do ministério advogam que o perfil de consumo de eletricidade dos brasileiros mudou nos últimos anos. O horário de pico, que antes ficava no intervalo de 18h a 19h, se espalhou ao longo do dia. O condicionador de ar ficou mais popular, e a jornada de trabalho tradicional (de 9h às 17h) deu espaço a arranjos alternativos.

“Ao invés do pico às 18h, você até pode ter um pico às 17h, e isso afeta a economia, diminui os valores. Agora, mesmo assim, você tem uma alta demanda entre 18h e 19h, e o horário de verão continua a minimizar esse pico. Toda economia, por menor que seja, é importante”, diz o professor de engenharia elétrica do UniCeub, Luciano Duque.

Outras vantagens

Uma outra vantagem apontada por Duque e por Mello, em entrevista ao G1, é que o horário de verão tem “custo zero” para o governo e para o setor privado. “Os únicos afetados diretamente são as emissoras de TV e as companhias aéreas, que precisam ajustar horário”, diz o presidente da Thymos.

Por isso, segundo eles, mesmo que a economia de gastos seja decrescente, o horário de verão ainda representaria uma escolha melhor que a alternativa – neste caso, o acionamento das termelétricas.

“A medição da economia que o governo faz, a cada horário de verão, é muito em cima das térmicas. Elas têm capacidade de sobra para absorver a demanda e evitar sobrecarga no sistema geral. Mas custam muito mais, tanto em dinheiro quanto em poluição”, diz Mello.

No relatório de estimativas para o horário de verão 2016/2017, divulgado pelo ONS no fim do ano passado, o operador do sistema elétrico lista algumas vantagens possíveis para aquele período:

“ganhos referentes ao custo evitado para contornar riscos em equipamentos em regime normal de operação”, com benefício de até R$ 35,5 milhões;

“redução da necessidade de geração térmica para atendimento à ponta e para a manutenção da segurança operativa durante os grandes eventos que ocorrem durante o período, tal como o Réveillon”, com economia de até R$ 147,5 milhões;

ganhos na “confiabilidade da operação elétrica” nos estados que entram no horário de verão (todos os das regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste);

“redução dos carregamentos nos troncos de transmissão, refletindo em melhorias no controle de tensão, maior flexibilidade operativa para realização de manutenções em equipamentos do sistema de transmissão e na redução dos cortes de carga em emergências”, com aumento da segurança no atendimento ao consumidor final, e

“pelo custo evitado de investimento na construção de térmicas a gás natural (US$ 750/kW) para atender à ponta, o equivalente da ordem de US$ 1,6 bilhão ou R$ 5,4 bilhões no SIN [Sistema Interligado Nacional]”.

Crise à vista

Essa economia pode ser ainda mais fundamental, segundo os especialistas ouvidos pelo G1, frente às projeções pessimistas de chuvas nas hidrelétricas nos próximos meses. A variação do clima pode dificultar a geração de energia nos próximos meses, e o governo já anunciou que poderá, inclusive, adotar a “bandeira vermelha de nível 2” na conta de luz.

A cada 100 kW/h, o consumidor pode pagar mais R$ 3,50. Por tudo isso, pela primeira vez desde o apagão energético de 2001, o governo brasileiro autorizou a importação de energia do Uruguai e da Argentina para não ter que comprar a energia mais cara das termelétricas.

Em 2015, quando o Brasil também enfrentou problemas climáticos e baixos níveis nos reservatórios de hidrelétrica, o então ministro de Minas e Energia Eduardo Braga (PMDB-AM) chegou a cogitar a medida reversa – ampliar o horário de verão em um mês. A ideia foi abandonada porque, segundo estudos, a economia gerada seria muito pequena.

Medida antiga

No Brasil, o Horário de Verão tem sido aplicado desde 1931/1932, com alguns intervalos. Nos últimos dez anos, segundo o governo federal, a medida tem possibilitado uma redução média de 4,5% na demanda por energia no horário de maior consumo e uma economia absoluta de 0,5%.

Os números parecem pequenos, mas essa economia equivale, em todo o horário de verão, ao consumo mensal de energia em Brasília, com 2,8 milhões de habitantes. A energia poupada também “reforça” o sistema, diminuindo a necessidade de uso da energia de termelétricas – mais cara e poluente.