Por Fabio Graner – Valor Econômico

Com o cenário de arrecadação com o Refis um pouco melhor do que vinha sendo cogitado pela equipe econômica nas últimas semanas de negociação no Congresso, já surge no governo o embate sobre o que fazer com uma possível sobra de recursos em relação ao projetado no último relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado em setembro.

O “excedente” decorre das surpresas nos leilões recentes da Cemig, do leilão de petróleo e do possível resgate de R$ 2 bilhões a R$ 4 bilhões em precatórios. O governo temia o risco de uma forte perda (cerca de R$ 5 bilhões) com mudanças no Refis, o que consumiria todos esses recursos extras. Com a projeção preliminar de se arrecadar entre R$ 6,6 bilhões e R$ 6,7 bilhões (perda de R$ 2,2 bilhões ante o relatório de setembro), esse cenário está ficando para trás.

Por isso, já emergem nos bastidores avaliações defendendo nova liberação de limites no orçamento para o pagamento de programas, enquanto outro grupo defende que, assim como em 2016, o governo faça um resultado primário melhor do que a meta de déficit de R$ 159 bilhões. É aventada ainda uma terceira alternativa: reduzir mais o estoque de restos a pagar.

Até o momento, o Refis já gerou cerca de R$ 4,3 bilhões (número que desconta migrações de outros programas) aos cofres. No governo já há quem aposte que o saldo ficará acima dos R$ 6,6 bilhões esperados até o fim do ano. Nessa hipótese mais otimista, o espaço fiscal ficaria maior para o governo decidir sobre como alocar os recursos. A MP do Refis foi aprovada na última quinta-feira no Senado. A Fazenda deve pedir vetos a alguns pontos, como a inclusão de empresas do Simples e a possibilidade de recurso em caso de exclusão do Refis.

Cabe ressaltar que as avaliações sobre a possibilidade de sobra de receitas no Orçamento ainda são preliminares, porque dependem de outros fatores além do Refis, como o desempenho das receitas correntes nos próximos meses e o resultado de leilões, como o da Lotex e dos campos do pré-sal. O fato, contudo, é que o debate sobre onde colocar eventual dinheiro extra deve se intensificar.

Os que defendem a realização de um resultado primário melhor partem da premissa que o déficit previsto na meta já é muito alto e que seria importante o país passar um sinal de melhora em sua complicada trajetória fiscal. Essa visão já perpassou as discussões sobre a definição das novas metas em agosto, mais foi derrotada quando prevaleceu a tese de que um resultado mais baixo, dada a frustração de receitas até aquele momento e os riscos envolvendo algumas receitas extras, como a dos leilões de concessão, seria necessário para evitar a paralisia da máquina federal.

A preocupação sobre a necessidade de dar oxigênio aos órgãos continua em parte do governo. As avaliações são que, mesmo a liberação de 12,8 bilhões (sendo que R$ 9,8 bilhões já foram efetivados), não será suficiente para garantir o andamento e conclusão de algumas obras da área de transporte, o funcionamento de universidades federais e atender necessidades de ministérios como Ciência e Tecnologia e Desenvolvimento Social.

Os ministérios finalísticos continuam reclamando de falta de recursos e levando à equipe econômica relatos de dificuldades em questões essenciais. Até informações de atrasos na medição de obras já prontas, e consequentemente demora nos pagamentos pela execução, já surgem nos bastidores do governo.

Uma fonte lembra que, apesar da liberação recente, a despesa federal prevista para o ano ainda está bloqueada em R$ 32 bilhões, mantendo-se significativamente abaixo do teto de gastos e prejudicando severamente alguns programas em curso.

Nessa discussão, há uma outra vertente defendendo que não sejam abertos novos limites orçamentários para os ministérios, mas que o eventual excedente de receitas seja usado primeiramente para redução dos restos a pagar de orçamentos anteriores. Essa rubrica é vista com uma espécie de dívida que não aparece na estatística do endividamento do país. Sua redução melhoraria o balanço do governo, limpando uma conta mais difícil de se acompanhar das contas públicas e que distorce a análise sobre a realidade fiscal.

Neste ano, o governo já pagou quase a metade (R$ 62,4 bilhões) do volume de R$ 131 bilhões de restos a pagar inscritos nas contas de 2017. O ritmo de redução está abaixo do verificado em igual período do ano passado, embora seja necessário lembrar que o movimento mais forte de regularização dessa conta ocorreu em dezembro de 2016, quando o governo pode contar com as receitas extras do programa de regularização de recursos no exterior (a chamada repatriação).

Na ocasião, o governo fez um mix de redução de restos a pagar e de um resultado fiscal melhor do que a meta. Uma fonte acha mais difícil repetir as duas coisas porque o orçamento está mais apertado, mas considera que essa estratégia seria a mais eficiente.