Por Daniel Rittner – Valor Econômico

04/06/2018 – 05:00

O governo pretende dar impulso à negociação de debêntures incentivadas de infraestrutura entre investidores estrangeiros com um novo mecanismo que oferecerá garantias financeiras contra o risco de inadimplência das empresas brasileiras. A ideia é facilitar a compra de títulos de longo prazo pelos investidores do exterior. Com isso, pretende-se viabilizar a captação de mais recursos por concessionárias de energia e transportes nos mercados internacionais.

A busca de meios alternativos de financiamento tem ganhado relevância com o enxugamento do papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na liberação de empréstimos. Desde a sanção da Lei 12.431, há quase sete anos, pessoas físicas ganharam isenção de Imposto de Renda ao aplicar em debêntures emitidas em reais por projetos de infraestrutura habilitados pelo governo – daí o nome “incentivada” para o papel.

O mercado doméstico, entretanto, ainda tem pouca demanda para absorver todos esses títulos. Uma opção usada pelas empresas é oferecer as debêntures ao investidor externo. Como elas são denominadas em reais, contrata-se simultaneamente um “swap” cambial, para proteção contra o risco de volatilidade da moeda.

O problema é que os bancos ou instituições financeiras não fazem “swaps” de longa duração – 10, 12, 15 anos ou mais – para projetos de infraestrutura no Brasil por desconfiança sobre a capacidade das concessionárias de pagar aos detentores das debêntures no vencimento dos títulos.

O presidente da Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF), Guilherme Estrada, explica que os investidores topam o risco embutido nos projetos de infraestrutura em si, mas não aceitam o risco cambial. “Já o banco aceita o risco cambial, mas não o risco de performance do projeto, se será entregue ou não”, explica.

A solução para mitigar o problema é a oferta de um novo seguro que poderá ser contratado pelo emissor das debêntures e com validade até o vencimento dos papéis – eventualmente até o término da concessão. Ele bancará integralmente o risco de calote das empresas brasileiras às instituições financeiras responsáveis pelo “swap” cambial.

Assim, acredita Estrada, essas instituições se sentirão mais à vontade para oferecer os “swaps” de longo prazo e viabilizar a compra das debêntures por investidores estrangeiros. Se o mecanismo realmente emplacar, abre-se uma janela importante ao financiamento da infraestrutura no país.

Os recursos para o seguro vão sair do Fundo Garantidor de Infraestrutura, administrado pela ABGF, que hoje dispõe de aproximadamente R$ 580 milhões em caixa. A agência pretende separar em torno de R$ 150 milhões para o novo produto.

Isso deverá ser suficiente para garantir, segundo Estrada, R$ 450 milhões em emissões. “Estamos partindo inicialmente de uma relação de 3 por 1.”

A engenharia financeira da operação entrou em fase final de consolidação depois de uma viagem dos diretores da ABGF para Nova York, na primeira quinzena de maio, onde a ideia foi apresentada para grandes investidores e recebeu sugestões de aperfeiçoamento.

Normalmente, conforme explica o presidente da agência, eles querem de 200 a 250 pontos-base acima do risco soberano para ficar com as debêntures de empresas brasileiras. A taxa é interessante quando comparada às linhas de financiamento do BNDES, que passou a adotar a TLP, somando-se ainda o spread do banco responsável pelo repasse.

Uma das primeiras medidas do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), criado no início do governo do presidente Michel Temer, foi reduzir a participação do BNDES nos empréstimos de longo prazo para concessões de infraestrutura.

Estrada faz questão de explicar que, na oferta do seguro, a ABGF não pretende “anuir qualquer risco” e observará se os projetos têm boas perspectivas de retorno econômico. Por isso, na largada, a prioridade deverá ser dada a empreendimentos “brownfield” (em operação) que precisam de recursos para ampliar capacidade. Nesse caso, segundo ele, há maior previsibilidade de receitas entrando no caixa das concessionárias e o risco é baixo.

De acordo com os registros do Ministério da Fazenda, houve 49 operações de emissão de debêntures incentivadas de infraestrutura no ano passado, totalizando R$ 9,1 bilhões. O setor de energia corresponde a 80% do valor negociado.

Projetos na área de transportes representam outros 12%. O restante se divide entre telecomunicações e saneamento básico.

No fim de 2017, estavam ativas 396 autorizações do governo para a emissão de debêntures com o benefício tributário. Elas foram qualificadas para financiar investimentos de quase R$ 200 bilhões nos segmentos.