Por Maria Luíza Filgueiras – Valor Econômico

02/08/2019 – 05:00

Depois de dois meses com volumes recordes em ofertas de ações no país, o novo ciclo de redução de juros iniciado esta semana pelo Comitê de Política Monetária reforçou a projeção de bancos e analistas de que a segunda metade do ano manterá um ritmo acelerado de operações em bolsa. Afinal, se aumenta o apetite dos investidores por ações, mais empresas conseguem emplacar ofertas e aproveitar cotações em alta.

Na conta dos bancos, no ano, as ofertas iniciais e subsequentes (IPOs e followons) devem chegar a R$ 100 bilhões, sendo que até julho já somam R$ 54 bilhões. No ano passado todo, foram R$ 11,3 bilhões. Empresa no país não falta: uma estimativa feita pelo Itaú em um relatório enviado a clientes estrangeiros é que o valor de companhias brasileiras totaliza cerca de R$ 38 trilhões – e só R$ 4 trilhões disso está na bolsa. É claro que nem todas essas empresas estão prontas ou precisarão abrir capital, mas algumas dezenas se preparam para isso.

No mapeamento para este ano, levantado pelo Valor com sete instituições, estão as ofertas iniciais da Caixa Seguridade, da rede de joalherias Vivara, da empresa de saneamento de Goiás, a Saneago, e da geradora de energia do mesmo Estado, a Celg GT, da Iguá Saneamentos, da empresa de análise de crédito Boa Vista SCPC, do Banco Votorantim e da holding de educação básica Saber. Nas ofertas subsequentes, estão Banco do Brasil, Banrisul, Banco Pan, BRF, Carrefour, Petrobras e JBS.

Na conta de 2020, os bancos já estão considerando algumas empresas – que, conforme o andamento dos próximos meses, podem se antecipar. Nessa lista, entram a corretora XP Investimentos, a rede de hospitais Rede D’Or, a rede de restaurantes Madero, os bancos digitais Agibank e Ebanx, a rede de academias Smartfit, os bancos mineiros Bonsucesso e BMG, a Caixa Pay, Caixa Asset, a BB DTVM e a rede de móveis e decoração Tok&Stok.

Como a projeção média do mercado é de Selic em 5% em dezembro, o Itaú estima que ainda há um fluxo adicional potencial para a bolsa de R$ 636 bilhões, considerando 10% de migração de renda fixa para ações. “Os investidores locais têm sido o grande vetor de sustentação da bolsa e devem continuar sendo. É uma mudança estrutural enorme termos saído de juros de 14% para 6% em menos de três anos”, diz Fábio Medeiros, diretor executivo do Morgan Stanley.

Os bancos consideram que se trata de um ciclo virtuoso. “Se os fundos de ações captam mais, eles precisam ter papéis para investir. Se não há ofertas, como a bolsa não tem um número grande de empresas líquidas, os gestores fecham os fundos para captação”, aponta Eduardo de la Peña, diretor da área de mercado de capitais do Credit Suisse.

Roderick Greenlees, chefe global do banco de investimento do Itaú BBA, reforça que grande parte das ofertas tem sido viabilizada com fluxo de dinheiro novo da bolsa. “No ano passado, víamos os gestores vendendo uma posição em carteira para entrar na oferta de outra empresa do mesmo setor, fazendo realocação. Não é o que tem acontecido este ano”, avalia. “Por isso o mercado absorveu ofertas grandes em curto espaço de tempo e todas com demanda excedente.”

Como a bolsa está em um patamar elevado historicamente, para a empresa já listada é a chance de tomar dinheiro novo ou monetizar suas ações em valor alto. Daí o volume relevante até agora de ofertas secundárias, que devem continuar com participação relevante, segundo os bancos. Para a empresa que não é listada ainda, é uma possibilidade de encontrar apetite do investidor e de usar o preço das concorrentes listadas como parâmetro. Até agora, de 20 ofertas de empresas brasileiras, apenas três foram IPOs, sendo uma em bolsa americana.

“Algumas empresas de consumo já mostram melhora de lucratividade. Pode ser uma sinalização inicial de que a economia está num ponto de inflexão, retomando crescimento, e isso pode viabilizar histórias novas na bolsa, elevando o número deIPOs”, diz Eduardo Miras,  chefe do banco de investimentos do Citi. As ações da Ambev, por exemplo, chegaram a subir 9,8% no dia dos resultados, que vieram acima das expectativas dos analistas – mas outros indicadores econômicos ainda mostram uma retomada vacilante.

Assim como aconteceu neste início de ano, operações de empresas controladas direta ou indiretamente pelo governo continuarão com parcela relevante nas ofertas. O BNDES pretende se desfazer de R$ 35 bilhões de sua carteira de ações até o fim do ano, incluindo fatias da Petrobras e JBS. No Banco do Brasil, o volume do follow-on pode ganhar corpo. O acionista vendedor será o FI-FGTS, mas o Tesouro pode vender junto algumas ações excedentes de controle, conforme uma fonte. Isso pode acontecer em outras empresas estatais.

A proposta da Caixa é fazer dois IPOs no ano. Além de Seguridade, a outra operação seria de Caixa Pay. No entanto, duas fontes consideram alta a probabilidade de essa oferta ficar para o início do ano que vem. “Há uma série de processos ainda em curso, para definir sócios em algumas áreas”, diz um executivo. A venda de participação do FI-FGTS na Alupar, que estava na lista dos bancos, virou dúvida, já que o comitê do fundo não aprovou o processo – mas pode rever a decisão no médio prazo. Já a fatia da Caixa no Banco Pan pode ser vendida já na próxima janela de mercado.

“Projetamos entre R$ 80 bilhões e R$ 100 bilhões para o ano, com participação de estatais. Pode ser que parte disso escorregue para o ano que vem”, diz Hans Lin, chefe do banco de investimento do Bank of America. “Assumimos um prazo de 18 meses pujantes.