Por Edna Simão e Fabio Graner – Valor Econômico

A atuação do conselho de administração da Caixa está sendo interpretada internamente como uma espécie de “intervenção” do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, no banco público, agravando o embate entre área econômica e a instituição.

Desde o ano passado, a Fazenda passou a ser mais atuante dentro da instituição financeira, o que vem sendo feito pela presidente do conselho, a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi. Esse processo se consolidou com a formalização do novo estatuto do banco, cujo desenho foi preparado totalmente na Fazenda e teve alguns ajustes depois de muita controvérsia interna com a direção do banco. Uma delas foi a ideia de transformar a instituição em SA, que acabou não ocorrendo.

O conselho da Caixa está interferindo até mesmo na seleção para cargos da diretoria, posição de terceiro escalão, atrás do presidente e dos vices. A informação foi confirmada pela assessoria da Caixa, após ser procurada pela reportagem, alegando que isso obedece ao novo estatuto e à nova política de seleção de cargos, que criou o banco de sucessores para o cargo de diretor-executivo.

O colegiado, que tem maioria da Fazenda, também montou um grupo especificamente voltado para acompanhar mais de perto a comunicação do banco, tanto para receber informações como para agir em assuntos de seu interesse.

Foi representando a visão do time liderado por Meirelles que o conselho interferiu e vetou a realização da operação de aporte do FGTS na empresa, o que ajudaria o banco a se capitalizar e a cumprir regras prudenciais sem precisar desacelerar tanto o crédito. Claramente a medida reflete uma visão já explicitada pelas autoridades fazendárias de que é preciso reduzir o tamanho do setor público.

Essa leitura de menor papel das instituições federais foi, de certa forma, contestada pelo próprio Temer e pela área política do governo, ao tratar a Caixa como “longa manus” do Estado na execução de política social.

O fortalecimento do conselho contou com a ajuda do Ministério Público, que em dezembro cobrou a saída de quatro vice-presidentes por denúncias de corrupção. Temer tentou resistir, sabendo das implicações políticas que viriam, mas, diante da repercussão negativa, ele sucumbiu e o processo passou a ser conduzido pela Fazenda.

Assim, foram destituídos recentemente três vice-presidentes por envolvimento em irregularidades. A seleção inicial deve ser feita por uma empresa de recrutamento, mas também será submetida ao conselho de administração.

A Caixa é presidida por Gilberto Occhi, que apesar de ser funcionário de carreira do banco federal, é uma indicação política do PP e tem interlocução direta com o presidente Michel Temer, sem passar por Meirelles. “Occhi nunca teve o apoio do Ministério da Fazenda”, disse uma fonte ao Valor.

Já há quem comente que, com o novo estatuto, o banco se tornou uma espécie de parlamentarismo, com Occhi tendo se tornado uma “rainha da Inglaterra” e as decisões mais relevantes sendo resolvidas pelo conselho.

Segundo informação veiculada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, a Caixa estaria realizando empréstimos para Estados e municípios recebendo receitas tributárias como garantia, o que seria proibido. Por esse motivo, o conselho do banco orientou a suspensão dessas operações. Ontem, no entanto, o colegiado sofreu um revés e teve que declarar, em nota, que as operações foram regulares, mesmo discurso de Meirelles e Occhi realizado pela manhã em evento no banco.

Técnicos do banco público reforçaram que essas operações são feitas há mais de 30 anos porque o jurídico entendia que não havia irregularidade. Essa mudança de opinião teria como pano de fundo a necessidade de Meirelles de intervir mais na gestão do banco.

Na avaliação de funcionários da instituição, a melhoria da gestão promovida pelo conselho de administração, que terá uma atuação direta na escolha de vice-presidentes, é bem-vinda. Mas o entendimento é que está ocorrendo excessos na atuação, o que acaba por desgastar a imagem da instituição.

Para Maria Rita Serrano, representante dos funcionários no conselho da empresa, a força do Ministério da Fazenda está exagerada e os cargos do colegiado deveriam incluir outras áreas do governo, especialmente as ligadas a políticas sociais do banco. Além disso, ela critica a atuação mais forte do governo na gestão da empresa, quando deveria ser mais estratégica.

Para ela, esse novo papel gera situações de conflito de interesses, como a participação de conselheiros em comitês do banco que depois apresentarão votos ao conselho.

Maria Rita avalia que, politicamente, a Caixa mudou seu eixo de influência da Presidência da República para o Ministério da Fazenda, a partir desse papel mais atuante do conselho. Ela enxerga, nisso, uma disputa política entre Meirelles e Temer, que estaria enfraquecido.

Uma fonte do governo, contudo, descarta essa hipótese e enxerga que, na verdade, há uma atuação mais autônoma de Ana Paula Vescovi, sem sequer ter respaldo de Meirelles. E nisso, segundo esse interlocutor, haveria dedo do PSDB, partido com o qual a secretária tem ligações, para tentar enfraquecer ainda mais o governo e ter mais espaço para a candidatura do governador Geraldo Alckmin.