Por Rodrigo Carro – Valor Econômico

As despesas das prefeituras brasileiras com educação, cultura, saúde e saneamento cresceram mais de 2,5 vezes desde 1972, como proporção dos recursos municipais desembolsados. Já os gastos com urbanismo minguaram nos últimos 44 anos, apesar de a população urbana no país ter mais que triplicado no período. As informações constam de um levantamento realizado pelo site Observatório de Informações Municipais, com base em dados de 1972 a 2016 abrangendo todas as cidades do país.

Em 1972, as despesas relacionadas à urbanização (serviços, infraestrutura e transporte) correspondiam a 27,41% dos recursos gastos pelas prefeituras. Na época, o percentual era superior a todos os gastos com educação, cultura, saúde e saneamento (20,49%). Essa proporção havia se alterado drasticamente no ano passado, constata o estudo realizado pelo geógrafo e economista François Bremaeker, gestor do Observatório. No ano passado, as despesas com urbanismo haviam encolhido para o patamar de 10,14%, enquanto os gastos com educação, cultura, saúde e saneamento aumentaram para 54,85%.

A vinculação de receitas públicas nas áreas de educação e saúde, a partir da década de 1980, foi decisiva na expansão desses gastos, destaca Bremaeker. Atualmente, 25% da receita tributárias e das transferências constitucionais devem obrigatoriamente ser aplicadas na educação por Estados e municípios. Para o segmento de saúde, o percentual obrigatório – definido pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000 – é de 15%. “Além disso, outras obrigações infraconstitucionais, como o financiamento de programas criados pelo governo federal [e implementados pelos municípios], vão automaticamente engordando as despesas com saúde e educação”, explica o geógrafo.

Como exemplo, ele cita creches construídas com recursos federais mas mantidas pelas prefeituras. E, também, as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), em que o custeio deveria ser em teoria repartido igualmente entre União, Estado e município. Com a retração da receita tributária nos níveis federal e estadual, muitos municípios se viram com a responsabilidade de financiar sozinhos o funcionamentos das UPAs. A estimativa da Confederação Nacional de Municípios (CNM) é de que há 171 Unidades de Pronto Atendimento fechadas no país.

Presidente da CNM, Paulo Ziulkoski atribui aos programas criados pelo governo federal nas últimas décadas – como o Saúde da Família e o Proinfância – grande parte do inchaço nos gastos com pessoal das prefeituras brasileiras. Estudo divulgado em outubro pela CNM contabilizava 1.297 municípios brasileiros (de um total de 5.570) com despesas de pessoal acima do limite constitucional ao fim de 2016.

Entre 1972 e 2010 (data do último censo demográfico no país), a população urbana no país saltou de 52,9 milhões (55,98% do total) para 160,9 milhões (84,34%). Iniciado nos anos 1960, o êxodo rural se intensificou nas décadas de 1970 e 1980.

Na contramão do fluxo de migrantes do campo para a cidade, os investimentos municipais em urbanização diminuíram. “Essa migração foi muito rápida e ocorreu de forma desordenada, desorganizada, sobrecarregando as cidades”, diz Ziulkoski.

Segundo Bremaeker, seria necessário destinar muito mais recursos para atender a demanda reprimida por serviços e infraestrutura urbana, gerada pela mudança no perfil da população brasileira. “A maior parte da pressão demográfica recaiu sobre as capitais”, enfatiza o autor do levantamento. Nas capitais brasileiras, os gastos com urbanismo diminuíram 3,88 vezes entre 1972 e 2016, em termos percentuais. Num período similar, entre 1970 e 2010, a população nessas cidades passou de 19,4 milhões de habitantes para 46,1 milhões – uma expansão de 2,38 vezes.

“As vinculações de receitas não deveriam ser feitas de forma linear”, defende Ziulkoski, da CNM. “Muitos municípios não têm onde gastar o percentual mínimo de 25% em educação e, com isto, têm as contas rejeitadas [pelos tribunais de contas].