Por Fábio Pupo e Edna Simão – Valor Econômico

A Caixa Econômica Federal estuda o uso de recebíveis de estatais como garantia em empréstimos concedidos a Estados e municípios. A medida é uma alternativa ao uso de receitas futuras de impostos e fundos públicos de participação, política do banco que foi suspensa pelo conselho de administração.

A decisão do conselho foi tomada em janeiro e suspendeu a concessão de empréstimos a Estados e municípios cujas garantias fossem as receitas provenientes de fundos de participação dos Estados e municípios: FPE e FPM. Existem dúvidas sobre a legalidade desse tipo de operação, utilizada pela Caixa para reduzir a alocação de capital. A retomada das operações para Estados e municípios sem garantia da União ainda depende da conclusão de estudos feitos pelo banco.

O presidente da Caixa, Gilberto Occhi, afirmou que o banco estuda diferentes opções para continuar concedendo crédito a Estados e municípios, mas que elas dependem de os entes terem garantias “robustas” para dar em troca. “Estamos trabalhando com alternativa de outras garantias. Vai depender da capacidade do Estado ou município ter outra opção que tenha robustez”, disse.

Uma das possíveis opções, segundo Occhi, são os recebíveis de estatais – por exemplo, contas de consumidores de empresas de saneamento. “É um recebível que pode servir de lastro para qualquer operação de crédito da companhia, ou se a companhia for ‘estadualizada’, do próprio Estado”, disse ao Valor.

O banco já faz operações similares diretamente com companhias de saneamento. Por isso, uma operação em benefício do Estado que use os mesmos ativos como garantia pode ficar impedida. “Fizemos no ano passado, por exemplo, um empréstimo de cerca de R$ 1,5 bilhão para a Sanepar, do Paraná. Se o Estado precisasse de um novo crédito, a Sanepar estaria comprometida”, explicou.

Segundo Occhi, outras operações podem ser feitas usando, por exemplo, royalties a serem recebidos pelos Estados – como é o caso de entes como Espírito Santo e Bahia. “Estamos trabalhando com diversas frentes”, disse.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, já afirmou que o Rio de Janeiro deve receber um empréstimo de R$ 1 bilhão em troca de royalties do petróleo como parte do plano de recuperação fiscal assinado em setembro do ano passado, mas Occhi adiantou que a Caixa não deve ser a responsável pelo crédito.

As alternativas são estudadas pela Caixa depois que o conselho de administração do banco anunciou no começo do mês uma “análise rigorosa” sobre a alocação de capital nos empréstimos sem garantia do Tesouro Nacional e com garantia do FPE e FPM. A interpretação, nos bastidores, é que esses tipos de garantia só poderiam ser concedidas ao Tesouro.

Para ele, o impasse em torno das operações é uma questão de interpretação. “Na Constituição está previsto esse tipo de garantia dada ao Tesouro, mas quando o Tesouro fez uma operação de crédito? Nunca, quem faz é o agente financeiro”, destacou. “Como sou integralmente do Tesouro, a interpretação da área jurídica da Caixa é que a Caixa é também União.

Eu sou 100% União, sou um braço da União para as políticas, inclusive de crédito. Nós entendemos assim, por isso, defendemos até o final a legalidade dessas operações”, disse.

Occhi explicou que as operações com receitas tributárias e dos fundos são feitas há vários anos e nunca foram questionadas antes. “Está se alegando a inconstitucionalidade, por isso estamos trabalhando com alternativa de outras garantias. Vai depender muito de o Estado ter outra garantia com robustez. Se não tiver, não faremos as operações”, disse.

Ele afirmou que as operações do tipo já firmadas continuam valendo. “O Banco Central já determinou que não vai avaliar as operações já dadas. Elas permanecerão válidas”, explicou.

O impasse em torno dos empréstimos a Estados e municípios ocorre em meio às discussões sobre a saúde financeira da estatal. O executivo defende a situação da instituição e diz que os números do banco devem ser conhecidos até o início de março, quando as demonstrações financeiras devem ser publicadas. Segundo ele, o balanço anual será o “melhor de todos os tempos”, algo decorrente de ações tomadas pelo banco, como o programa de demissões voluntárias (PDV), e medidas implementadas para reduzir a inadimplência. “Vamos ter uma grande oportunidade de surpreender as pessoas”, disse.