Por Denise Neumann e Rafael Rosas – Valor Econômico

06/11/2018 – 05:00

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, deu sinais claros, em duas entrevistas ontem, de que sua visão para a reforma da Previdência é de um ajuste gradual que passa pelo respeito aos contratos.

À “TV Aparecida”, ele falou em aprovar este ano uma pequena elevação da idade mínima. Na Bandeirantes, foi além. Quando o apresentador José Luiz Datena perguntou se era possível acertar as contas fiscais sem uma reforma da Previdência, lembrando que é uma medida altamente impopular, Bolsonaro foi claro: “Devemos honrar nossos contratos. Não podemos simplesmente mudar uma regra no meio do caminho sem levar em conta o ser humano que pode ter sua vida completamente modificada. Às vezes, um ou outro assessor só pensa em números.”

Nas duas entrevistas, Bolsonaro falou que trabalha com a hipótese de aprovar parte da reforma proposta pelo governo de Michel Temer, mas, se isso não ocorrer, então, sim, apresentará proposta própria no ano que vem. Nas suas respostas, contudo, transpareceu que essa ideia própria é ainda embrionária.

Em um momento, ele se referiu a ela como “alguma proposta de Previdência”. Depois, falou que o modelo de capitalização gera nele mesmo “desconfiança”.

Na entrevista para a “TV Aparecida”, gravada na quinta-feira e que foi ao ar ontem à tarde, ele disse que vai tentar evitar o “desânimo” que toma conta de Brasília depois das eleições e aprovar “alguma coisa na reforma da Previdência” ainda este ano.

“O grande passo, no meu entender, vamos [tentar] passar para 61 anos o serviço público para homens e 56 anos para mulheres e majorar também um ano nas demais carreiras. Eu acredito que seja um bom começo pra gente entrar o ano que vem já tendo algo de concreto para nos ajudar na economia”, disse Bolsonaro.

Ele insistiu em um ponto já defendido: “Não adianta você ter uma boa proposta de reforma previdenciária se ela não vai passar na Câmara e no Senado. Queremos dar um passo, por menor que seja”.

Questionado sobre quais pontos defende em relação à Previdência, frisou que, no serviço público, deve acabar com as incorporações. “Depois de algum tempo, não são todos, mas alguns servidores incorporam os cargos em comissão que desempenhavam até aquele momento”, disse, acrescentando que não se “pode generalizar” idade mínima de 65 anos para todas as carreiras, devido às peculiaridades de cada emprego.

Na entrevista à Bandeirantes, ao defender que é preciso honrar contratos e criticar “um ou outro assessor só pensa em números”, Bolsonaro ligou essa avaliação à ideia de recriação da CPMF.

“Uma CPMF em que paga quem recebe, paga quem saca. Não existe isso de CPMF, não existe recriação e muito menos uma hipótese de 0,9%. Isso onera toda a cadeia, mais de uma vez. Não queremos salvar o Estado quebrando o cidadão”, disse.

Bolsonaro explicou que “isso tudo está sendo organizado e conduzido pelo Paulo Guedes”, em resposta que abarcou a CPMF e a Previdência. Questionado se defendia a capitalização como uma alternativa na reforma da Previdência, mostrou que ainda não está convencido dessa hipótese – que também não foi ainda apresentada oficialmente pelo seu futuro ministro da Economia, embora seja defendida por alguns integrantes da sua equipe de transição.

Ao falar sobre capitalização, disse que ela gera nele mesmo desconfiança, mas que “questionar” as propostas é parte da sua responsabilidade quando os assessores trazem propostas. “Tenho responsabilidade. No passado, tivemos isso, até nas Forças Armadas, os montepios, que depois quebraram”, disse ele. “Quem vai garantir essa nova Previdência? Se não der certo quem vai pagar? Temos que decidir… hoje é o Tesouro.”

Na sequência, o presidente eleito defendeu, sobre a Previdência, que “fazendo acertos, de forma gradual, você atinge o mesmo objetivo sem colocar em risco, sem levar em pânico a sociedade”.

Por fim, Bolsonaro afirmou: “Não tem cabimento que um militar com 65 anos esteja na ativa; é preciso ver especificidades. Qual expectativa de vida no Piauí, qual expectativa de vida de um PM no Rio de Janeiro? Não é justo tratar todo mundo com a mesma regra”.