O Rio de Janeiro, onde apenas 33% do esgoto é tratado, é o único do Sudeste a negociar com o banco

Por MARTHA BECK, O Globo

BRASÍLIA – O BNDES trabalha em parceria com oito estados, incluindo o Rio de Janeiro, para estruturar projetos de privatização, concessão ou parcerias públicos-privadas (PPPs) na área de saneamento. Em entrevista ao GLOBO, o presidente do banco, Dyogo Oliveira, afirmou que os projetos terão impacto sobre 471 municípios que reúnem 40 milhões de pessoas, das quais 5 milhões não têm acesso a água e 21 milhões não têm esgoto tratado. No caso do Rio, o trabalho abrange os mais de 60 municípios cobertos pela Cedae.

– A área de saneamento precisa de investimentos e os estados, que estão com dificuldades financeiras, não têm condições de levantar todo o dinheiro necessário sem bater no limite de endividamento – afirmou Oliveira.

O Rio é o único estado da região Sudeste a negociar com o BNDES. Os outros sete são no Norte e no Nordeste e possuem problemas seja na oferta de água tratada, na coleta ou no tratamento de esgoto. Nos municípios fluminenses, o tratamento de água é elevado, 92%, mas a taxa de coleta de esgoto é de 51%, enquanto o tratamento desses rejeitos fica em apenas 33%. Em outros estados apenas 7% do esgoto é tratado e a cobertura de água é de 43%.

Num diagnóstico inicial, dos 471 municípios analisados, a maior parte das empresas de saneamento têm passivo elevado, inadimplência alta (que chega a 50% em alguns casos), sendo que 274 não possuem planos de saneamento básico. Segundo o BNDES, o Brasil como um todo tinha uma demanda de investimentos em saneamento de R$ 20,3 bilhões por ano entre 2013 e 2033. Esse seria o montante necessário para universalizar o serviço no país.

De acordo com os dados levantados pelo banco, no entanto, os recursos aplicados em saneamento no Brasil ficaram muito abaixo da necessidade. Eles subiram de R$ 7,41 bilhões em 2007 para R$ 13,16 bilhões em 2010. Esse montante chegou a R$ 14,36 bilhões (melhor desempenho a partir de 2007) em 2014 e depois foi sendo reduzido gradualmente, atingindo R$ 10,05 bilhões em 2016.

– A situação é dramática – disse Oliveira.

Segundo ele, um dos maiores problemas para o investimento em saneamento é que a responsabilidade pela prestação desse serviço varia de estado para estado. Há lugares em que isso é feito pelos municípios, em outros pelo estado, sendo que em outras localidades há uma dependência de recursos federais. A estratégia do BNDES é proporcionar o acesso dos estados ao mercado de capitais com modelos que não prevejam o pagamento de outorgas pelos operadores privados.

Para tentar melhorar o ambiente de negócios nesse segmento, o governo editou em julho a medida provisória (MP) 844, cujo objetivo principal era incentivar justamente o aumento da participação privada em saneamento. O texto, entre outras ações, prevê um aumento da concorrência entre concessionárias estaduais públicas e as empresas privadas que atuam nessa área. Ele obriga os municípios a realizarem uma concorrência na hora de contratar a prestação de serviços. Anteriormente, se houvesse interesse em fazer uma parceria com uma companhia pública, não havia necessidade de licitação.

O assunto, no entanto, já gerou contestação. A MP está sendo alvo de questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF) e, na semana passada, a comissão mista do Congresso que examina o assunto adiou a escolha de seu presidente e do vice-presidente. Não houve acordo para a definição dos dirigentes.

A parceria do BNDES com os oito estados faz parte de um esforço da área de desestatização e estruturação de projetos da instituição. Ela já tratou de projetos para iluminação pública e de rodovias. No caso do saneamento, a primeira etapa foi fazer um diagnóstico da infraestrutura existente e propor modelos. Após os governos estaduais baterem o martelo, o banco ficará encarregado da modelagem do projeto e de preparar o suporte para a licitação.