Por Fabio Graner e Fábio Pupo – Valor Econômico

21/03/2019 – 05:00

O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, disse em entrevista ao Valor que quer a devolução de todos os R$ 270,9 bilhões de créditos que o Tesouro Nacional tem para receber do BNDES até o fim do governo Jair Bolsonaro. Ele reiterou a cobrança de R$ 100 bilhões adicionais neste ano, além dos R$ 26 bilhões já previstos, feita por meio de ofício recentemente enviado ao banco. Mas destacou que isso pode ser feito de forma escalonada, desde que parte “substancial”, em torno de 40% a 50%, venha no primeiro semestre.

Ao dizer que quer zerar os recursos do Tesouro no BNDES, o secretário, que ocupa uma função equivalente a um vice-ministro, sinaliza uma redução ainda maior do banco nos próximos anos. Além disso, impõe um desafio de a instituição encontrar novas fontes de recursos para suas operações e também para garantir um caixa mínimo, já que suas disponibilidades diminuirão bastante já com a devolução prevista para este ano.

Embora não discorde da estratégia de reduzir o BNDES, o presidente da instituição, Joaquim Levy, quer um processo feito de forma cautelosa, sem colocar em risco questões contábeis relativas à instituição, como nível de capital nas chamadas regras de Basileia. Isso tem sido visto como um sinal de resistência de Levy aos pedidos da Fazenda. Uma fonte do banco, contudo, disse que a fala do secretário indicando aceitar uma devolução parcelada, dentro das possibilidades do banco, foi bem recebida.

Em sua página na internet, o BNDES aponta que 205,7 bilhões do total emprestado pelo Tesouro estão comprometidos com operações de crédito. Isso deixaria para o banco um espaço mais restrito para devoluções no curto prazo. Para Rodrigues, isso não é motivo para travar a devolução de recursos do banco para o Tesouro neste ano. O relevante para essa decisão, na visão da Fazenda, é o caixa total disponível da instituição, que supera os R$ 160 bilhões, quando se incluem ativos de renda variável.

“O que importa é a disponibilidade financeira, a liquidez do banco. A restrição que se traz na questão da devolução é a disponibilidade de liquidez, que é muita alta”, disse, informando que o caixa do BNDES tem R$ 113 bilhões em título públicos e operações compromissadas, além de mais R$ 55 bilhões em “equities”. “De maneira hiperconservadora, o banco precisaria de 25 bilhões de caixa”, acrescentou, informando ainda que o BC calculou que ter disponibilidade de R$ 15 bilhões seria suficiente para o banco operar sem correr riscos.

O secretário disse que o banco se agigantou no passado e que não cabe à instituição federal de fomento ter desembolsos da ordem de R$ 200 bilhões por ano, como ocorreu em alguns anos anteriores, pois isso leva à redução do setor privado na oferta de crédito, sobretudo no mercado de capitais.

“Precisamos promover um crowding in [inclusão] do setor privado”, salientou. “A participação do crédito privado no mercado é muito acanhada, muito tímido. O crédito direcionado no Brasil é muito alto”, disse, lembrando que metade do estoque de financiamentos no país é com recursos direcionados, normalmente operado por bancos públicos.

Rodrigues disse não temer que o banco se apequene ou sofra de “nanismo”. E afirmou que um volume de desembolsos superior a R$ 100 bilhões anuais já geraria desconforto na área econômica. Atualmente, o fluxo de empréstimos é da ordem de R$ 69 bilhões.

Para ele, a devolução dos R$ 100 bilhões adicionais – já há R$ 26 bilhões programados para este ano devido a renegociação feita no governo anterior entre o Tesouro e o banco – vai ajudar na redução de 1,5 ponto porcentual na dívida pública, além de contribuir para esse processo de maior inclusão do setor privado no sistema de crédito brasileiro.

O governo quer evitar que a dívida bruta supere 80% do Produto Interno Bruto (PIB), nível que ultrapassado seria visto com insegurança por investidores. Hoje, ela está em 77,6% do PIB.

Rodrigues destacou que, no período de 2004 a 2016, os cerca de R$ 500 bilhões que foram emprestados pelo Tesouro ao banco estatal tiveram um custo fiscal de R$ 170,3 bilhões. Esse valor, mantido o cronograma de devolução definido no ano passado, subiria em R$ 30 bilhões até 2040, último ano de vigência dos contratos.

O secretário especial destacou que o banco terá um papel relevante no financiamento de concessões na área de infraestrutura, embora o governo também pretenda fomentar uma participação crescente do mercado de capitais para suprir esses recursos.

Outro foco relevante para a instituição de fomento, na visão da Fazenda, é a ampliação do crédito para as empresas de menor porte.

O secretário disse que está em curso mudanças no conselho do banco. Segundo ele, o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco é um bom nome para fazer parte do colegiado.