Ela é o melhor e mais eficaz antídoto contra o risco de populismo econômico

Luiz Felipe D’ávila*, O Estado de S.Paulo
25 de setembro de 2019 | 03h00

Uma das poucas oportunidades que o Brasil tem para reativar o crescimento econômico é a retomada do investimento em infraestrutura. Há muito dinheiro no mundo em busca de bons negócios. E o Brasil poderia beneficiar-se imensamente do apetite dos investidores se fosse capaz de eliminar os gargalos da insegurança jurídica.

O governo e o Congresso Nacional deveriam trabalhar em conjunto para aprovar três medidas fundamentais para reduzir a insegurança jurídica e estimular o investimento em infraestrutura.

l Aprovar uma lei de concessão simplificada para obras de infraestrutura – É preciso criar uma lei de licitação que estimule a competição de mercado para determinar preço, prazo e projeto vencedor nas concessões de infraestrutura. A lei de concessão simplificada é uma espécie de licitação fast track. Ela substituiria a Lei 8.666, que regulamenta todas as licitações públicas – não importa se o governo tem de comprar lápis ou contratar um consórcio de empresas para construir uma rodovia ou um porto.

 

A Lei 8.666 transformou-se num entrave para os governantes e um estorvo para os investidores em projetos de infraestrutura. E engessou de tal forma as licitações e as contratações do setor público que não há investidor sério que consiga atender às demandas infinitas de burocratas, órgãos fiscalizadores e agentes reguladores – e manter a viabilidade econômica do projeto. Essa lei, que foi concebida para moralizar as licitações e garantir que os governos comprassem produtos pelo menor preço, fracassou.

As contratações de produtos e serviços pelo “menor preço” tornou-se uma farsa. Os valores dos contratos são corrigidos por aditivos que garantem os reajustes de preços necessários para tornar os projetos economicamente viáveis. Quanto à moralização das contratações públicas, a Lava Jato revelou o conluio entre empreiteiras e governos para vencerem licitações e, em troca, alimentarem o maior esquema de corrupção e de caixa 2 do planeta.

l Reeditar a MP 882 – A Medida Provisória n.º 882, no capítulo V, artigo 16, criou a colação, um procedimento que permite a contratação de consultorias renomadas para elaborar projetos de concessão, definir os critérios técnicos da licitação e também garantir o fornecimento de informações para os órgãos fiscalizadores, como o Tribunal de Contas. Ademais, a medida provisória permite que as empresas interessadas em participar das licitações contratem especialistas para detalhar projetos executivos e validar estudos de viabilidade econômica de suas propostas.

É inacreditável, mas, no Brasil, empresas podem vencer licitações sem apresentar projeto executivo e estudo de viabilidade econômica. O resultado são obras inacabadas ou mal executadas e, em alguns casos, empresas incapazes de cumprir o que foi acordado.

Curiosamente, a MP 882 foi aprovada na comissão mista do Congresso, mas expirou o prazo para ser votada em plenário. É fundamental que ela seja reeditada e aprovada no Congresso, para que o País tenha um novo modelo de licitação, mais rigoroso na análise da viabilidade, dos prazos e dos custos das propostas. E dê mais celeridade aos processos de concessão.

l Criar o Fundo de Transparência do Ministério Público – O Ministério Público exerce papel fundamental na defesa dos interesses da sociedade, mas a profusão de ações públicas – muitas delas descabidas – levou à excessiva judicialização das disputas. Boa parte desse problema deriva de um incentivo perverso. O Ministério Público não paga custas, tampouco sucumbência, quando perde as ações públicas. Essas despesas são lançadas no orçamento do Poder Judiciário e ninguém sabe qual é o seu devido valor. Para cercear o abuso de ações públicas infundadas é vital acabar com essa caixa-preta e dar mais transparência ao uso do dinheiro público.

A criação do Fundo de Transparência do Ministério Público cumpre esse papel. As despesas com custas e sucumbência das ações públicas terá de ser anualmente estimada e apresentada ao Congresso na hora de negociar o Orçamento da Nação. A explicitação dos gastos com custas e sucumbência servirá como importante estímulo para o Ministério Público se tornar mais criterioso e rigoroso na sua atuação. Na Justiça do Trabalho, por exemplo, caiu 36% o número de ações trabalhistas após a reforma que instituiu o ônus de custas para o autor da ação. As Cortes e as ações legais deveriam ser recursos de última instância. A arbitragem é um excelente mecanismo para resolver desavenças de maneira célere e eficaz.

Se o governo e o Congresso adotassem essas três medidas, o Brasil poderia pavimentar o caminho da recuperação econômica e a retomada do investimento. O Estado continua a ser um grande entrave ao crescimento. Essa sanha de especificar tudo em leis, normas e regulações inibe a inovação, o investimento e as parcerias entre o setor público e o privado para resolver os grandes gargalos de infraestrutura. O Brasil tem pressa para resolver o vergonhoso problema do saneamento básico, que priva 100 milhões de brasileiros de terem acesso à coleta de esgotos e 35 milhões de pessoas de disporem de água potável. Tem pressa para resolver os gargalos de transporte, que drenam a competitividade do País.

Causa estranheza e apreensão o fato de o governo não tratar com senso de urgência a agenda da retomada do crescimento. Se a economia continuar paralisada em 2020, a pressão política aumentará vertiginosamente e Bolsonaro poderá abrir mão do verniz liberal que lustra a política econômica e redobrar a sua aposta nas medidas populistas. Seria um cenário desastroso para o País.

Portanto, é vital dar prioridade à agenda do crescimento, do investimento e da geração de empregos. Ela é o melhor e mais eficaz antídoto contra o populismo econômico.

*FUNDADOR DO CENTRO DE LIDERANÇA PÚBLICA, É AUTORDO LIVRO ‘10 MANDAMENTOS– DO PAÍS QUE SOMOS PARA O BRASIL QUE QUEREMOS’